Entenda a reintegração de posse “humanizada” do Ministro Barroso

nov 16, 2022

No dia 31/10/2022 o Ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, tomou uma decisão inédita, segundo a grande mídia: a de “humanizar”qualquer reintegração de posse no Brasil.

A revista Veja assim noticiou:

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, decidiu nesta segunda-feira, 31, de uma forma inédita no país, humanizar qualquer reintegração de posse no Brasil (Revista Veja, acesse aqui)

A decisão tomou tal repercussão que virou objeto da fake news, fazendo com que circulasse a falsa notícia de que Barroso acabara com a propriedade privada no Brasil.

A notícia tomou ainda maior peso, pois foi divulgada logo após as eleições. O que fez com que os desavisados leitores relacionassem a suposta “perda da propriedade privada” à ideologia do governo eleito. O que, por óbvio, não é real.

No presente texto, a questão será esclarecida.

I – A ação que culminou na decisão de Barroso

No ano de 2.021, o PSOL ajuizou a ADPF 828 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) com o objetivo de garantir os direitos à moradia e à saúde de pessoas em condição de vulnerabilidade.

Um dos pedidos da ação foi a imediata suspensão de todos os processos (e todas as medidas) de despejos, desocupações, reintegração de posse, etc enquanto persistissem os efeitos da crise do coronavírus.

O pedido de suspensão foi feito sob o argumento de que o direito à moradia está diretamente relacionado à proteção da saúde, tendo em vista que a moradia é essencial para o isolamento social. Defendeu-se, portanto, que diante de excepcional situação, os direitos de propriedade e de posse deveriam ser ponderados com a proteção da vida e da saúde das populações vulneráveis.

II – Entenda o contexto das decisões tomadas no processo

No processo em questão, algumas decisões foram tomadas relativas tanto às desocupações de imóveis urbanos e rurais, quanto aos pedidos de liminares em despejos.

De forma geral, nas primeiras decisões foi permitida a suspensão dessas desocupações para proteger o direito à moradia dos ocupantes. Em seguida, trecho de algumas decisões tomadas no início do processo:

Ocupações anteriores à pandemia:

suspender pelo prazo de 6 (seis) meses as medidas administrativas ou judiciais que resultem em despejos, desocupações, remoções forçadas ou reintegrações de posse de natureza coletiva em imóveis que sirvam de moradia ou que representem área produtiva pelo trabalho individual ou familiar de populações vulneráveis, nos casos de ocupações anteriores a 20 de março de 2020, quando do início da vigência do estado de calamidade pública.”

Ocupações posteriores à pandemia:

“suspender pelo prazo de 6 (seis) meses as medidas administrativas ou judiciais que resultem em despejos, desocupações, remoções forçadas ou reintegrações de posse de natureza coletiva em imóveis que sirvam de moradia ou que representem área produtiva pelo trabalho individual ou familiar de populações vulneráveis, nos casos de ocupações anteriores a 20 de março de 2020, quando do início da vigência do estado de calamidade pública.”

“com relação às ocupações ocorridas após o marco temporal de 20 de março de 2020, referido acima, que sirvam de moradia para populações vulneráveis, o poder público poderá atuar a fim de evitar a sua consolidação, desde que as pessoas sejam levadas para abrigos públicos ou que de outra forma se assegure a elas moradia adequada.”

“suspender pelo prazo de 6 (seis) meses, a contar da presente decisão, a possibilidade de concessão de despejo liminar sumário, sem a audiência da parte contrária (art. 59, §1º, da Lei nº 8.425/1991), nos casos de locações residenciais em que o locatário seja pessoa vulnerável, mantida a possibilidade da ação de despejo por falta de pagamento, com observância do rito normal e contraditório.”

No curso do processo, os efeitos de algumas decisões foram prorrogados.

III – O que foi decidido no dia 31/10/2022?

Ultrapassadas as questões acima, a decisão que deu o que falar na mídia recentemente foi o deferimento parcial de uma liminar para determinar a adoção de um regime de transição para a retomada da execução de decisões suspensas, nos termos seguintes:

(a) Determino que os Tribunais de Justiça e os Tribunais Regionais Federais instalem, imediatamente, comissões de conflitos fundiários que possam servir de apoio operacional aos juízes e, principalmente nesse primeiro momento, elaborar a estratégia de retomada da execução de decisões suspensas pela presente ação, de maneira gradual e escalonada;

(b) Determino a realização de inspeções judiciais e de audiências de mediação pelas comissões de conflitos fundiários, como etapa prévia e necessária às ordens de desocupação coletiva, inclusive em relação àquelas cujos mandados já tenham sido expedidos. As audiências devem contar com a participação do Ministério Público e da Defensoria Pública nos locais em que esta estiver estruturada, bem como, quando for o caso, dos órgãos responsáveis pela política agrária e urbana da União, Estados, Distrito Federal e Municípios onde se situe a área do litígio, nos termos do art. 565 do Código de Processo Civil e do art. 2º, § 4º, da Lei nº 14.216/2021.

(c) Determino que as medidas administrativas que possam resultar em remoções coletivas de pessoas vulneráveis (i) sejam realizadas mediante a ciência prévia e oitiva dos representantes das comunidades afetadas; (ii) sejam antecedidas de prazo mínimo razoável para a desocupação pela população envolvida; (iii) garantam o encaminhamento das pessoas em situação de vulnerabilidade social para abrigos públicos (ou local com condições dignas) ou adotem outra medida eficaz para resguardar o direito à moradia, vedando-se, em qualquer caso, a separação de membros de uma mesma família. Autorizo, por fim, a imediata retomada do regime legal para desocupação de imóvel urbano em ações de despejo (Lei nº 8.245/1991, art. 59, § 1º, I, II, V, VII, VIII e IX).

Assim, trocando em miúdos foi determinado que os tribunais instalem comissões de conflitos fundiários, bem como, no caso dos imóveis com ocupações coletivas, para que previamente a essas retomadas sejam realizadas audiências de conciliação.

Ou seja, em momento algum houve supressão da propriedade privada, tampouco se pretendeu dificultar a retomada dessas posses. Na realidade, pretendeu a decisão possibilitar a retomada dos imóveis de forma cautelosa, como ressaltou o ministro:

“Ainda que no cenário atual a manutenção integral da medida cautelar não se justifique, volto a registrar que a retomada das reintegrações de posse deve se dar de forma responsável, cautelosa e com respeito aos direitos fundamentais em jogo. Por isso, em atenção a todos os interesses em disputa, é preciso estabelecer um regime de transição para a progressiva retomada das reintegrações de posse” (Leia mais em: https://veja.abril.com.br/coluna/matheus-leitao/barroso-toma-decisao-inedita-sobre-reintegracoes-de-posses/)

https://veja.abril.com.br/coluna/matheus-leitao/barroso-toma-decisao-inedita-sobre-reintegracoes-de-posses/

Quando é devido o ITBI? O que muda com a decisão do STF?

fev 24, 2021

I – Introdução

O ITBI (imposto de transmissão inter vivos) é um imposto cobrado pelos Municípios nas operações de transferência de bens imóveis. Portanto, grosso modo, é o tributo que se paga ao Município quando ocorre, por exemplo, uma compra e venda.

Recentemente o Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1294969, com repercussão geral (Tema 1124), decidiu que:

O fato gerador do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro

O acórdão que concluiu pela ementa acima concluiu sobre a impossibilidade de se exigir o recolhimento do ITBI nas operações de promessa de venda e compra e cessão de direitos.

Daí, fica o questionamento: o que muda com a decisão do Supremo? E afinal, quando pode ser cobrado o ITBI? Esses questionamentos serão colocados em seguida.

I – O que é ITBI?

Se você está acostumado a comprar imóveis provavelmente já teve a obrigação de pagar esse tributo.

O ITBI está previsto na Constituição Federal no art. 156, II, cujo texto se transcreve:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

Assim, cada Município possui sua legislação que trata sobre a cobrança do ITBI. Mas a Constituição Federal deixa claro que esse imposto incide quando ocorre a transmissão “entre vivos”, por ato oneroso (ou seja, que produza vantagens e obrigações para ambas as partes), de direitos reais sobre imóveis.

Portanto, o ITBI é devido na compra e venda de imóvel, mas não só. Trata-se de um imposto pago ao Município, conforme estabelece a legislação daquele Município.

II – O que é fato gerador de um tributo?

Sem pretender um aprofundamento na questão tributária, é necessário esclarecer o que é fato gerador. Como o próprio nome indica, fato gerador é ocorrência de uma situação que dá ensejo a obrigação de cobrar o tributo. Em outras palavras, é aquilo que gera a obrigação do pagamento do tributo.

III – A prática do ITBI nas cessões de direitos e na lavratura de escritura pública de venda e compra

Muitas vezes ocorre de o verdadeiro proprietário do imóvel (aquele que possui seu nome no registro, que chamaremos de Ricardo) realizar um contrato particular de promessa de compra e venda para determinada pessoa (que chamamos de Maria) e essa, sem registrar o imóvel em seu nome, realizar uma cessão de direitos através de contrato para um terceiro (chamaremos de João).

Neste caso, quando João vai ao cartório de notas para lavrar a escritura pública para, finalmente, passar o imóvel para seu nome, o tabelião exige o recolhimento do ITBI nas duas operações (bitributação). Tanto na transmissão de Ricardo para Maria, quanto na de Maria para João.

Já na lavratura de escritura pública de venda e compra, mesmo sem existir cessão de direitos, a praxe é o tabelião de notas exigir a quitação previa do ITBI. De modo que na prática tem ocorrido de o imposto ser exigido antes mesmo de seu fato gerador, que é o registro.

O tabelião procede desta forma por alguns motivos: a) primeiro, porque é dever do notário fiscalizar o recolhimento dos impostos incidentes sobre os atos que deve praticar (art. 30, XI Lei nº 8.935/94), de modo que ele é responsável por isso; b) segundo, porque ele deve observar a lei. Sobretudo a lei Municipal, que muitas vezes exige o recolhimento; c) terceiro, ele o faz em observância à cadeia dominial do imóvel.

IV – A decisão do STF e sua repercussão nas serventias extrajudiciais

No tópico anterior, tratou-se da prática acerca do recolhimento do ITBI nos Municípios. Ocorre que, no julgamento cujo acórdão fora publicado dia 19/02/2021, o STF redefiniu claramente que o fato gerador do tributo somente se dá com a transmissão da propriedade, o que ocorre mediante o registro. Na decisão ficou claro também que não se pode cobrar o tributo na cessão de direitos.

A decisão do STF não surpreende, afinal:

a) o próprio art. 1.245 do Código Civil é enfático ao estabelecer que “transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis”;

b) antes da referida decisão do STF existiam jurisprudências esparsas confirmando que foi, agora, reafirmado pelo supremo.

Desta forma, questiona-se: como os notários vão se portar diante da jurisprudência do supremo?

Diante dessa questão, o Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) publicou a Nota Técnica nº 01/2021, sobre a tese firmada pelo STF, cuja conclusão se transcreve:

Desse modo, o IRIB ESCLARECE e RECOMENDA aos registradores imobiliários do país, respeitada obviamente a sua independência jurídica, que continuem observando a legislação local em vigor (princípio da legalidade estrita), especialmente as leis tributárias do município e normas das egrégias Corregedorias-Gerais da Justiça, até que as mesmas se adequem à tese firmada pelo STF, se for o caso.

Portanto, apesar da tese firmada pelo STF, considerando que os notários e registradores têm de respeitar a lei e considerando que as legislações Municipais ainda não sofreram modificação, acredita-se que a situação na prática será mantida.

No entanto, diante dessa tese e considerando a repercussão da temática, espera-se que os Municípios adequem suas legislações e, ainda, que os Estados se manifestem através de provimentos acerca da cobrança do ITBI nessas operações. Só aí é que os notários e registradores se sentirão motivados a trabalharem de forma diversa.

V – Conclusão

A tese firmada pelo STF certamente acarretará inúmeras movimentações no sentido de serem mudadas a regra do jogo. Afinal, é sensato que associações e institutos representativos de classe se unam para que o que fora firmado se torne prática no mercado imobiliário. Se o itbi só é devido com o registro, não há motivo de as legislações Municipais manterem a exigência (diga-se, inconstitucional) do recolhimento do imposto nas cessões de direitos e, ainda, antes do registro do título no cartório de registro de imóveis.

A questão é delicada e ainda repercutirá em diversas classes. Aguardemos o desenrolar da matéria no âmbito dos Municípios e das normas de serviços das corregedorias.

A mídia, Gusttavo Lima e a Súmula do STF

out 17, 2020

A relação de Gusttavo Lima com Andressa Suita tem gerado grande repercussão nas mídias sociais e, ainda, em canais de notícias. São inúmeras mídias noticiando informações acerca da separação e do patrimônio do casal.

Dentre essas informações, merece destaque aquela segundo a qual Súmula do STF poderia beneficiar Andressa Suita a ter direito de partilha de bens com Gusttavo Lima (veja as notícias aqui, aqui e aqui).

No jornal Extra, jornal popular de grande circulação, foi noticiado que “Pela súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, Andressa têm direito à metade dos bens de Gusttavo adquiridos após o casamento, em que ela tenha, direta ou indiretamente, participação na aquisição. Ou seja, bens adquiridos durante a união podem, sim, ser partilhados”.

Portanto, segundo as notícias, ainda que um casal tenha firmado o matrimônio sob o regime da separação de bens, os cônjuges teriam direito ao que foi adquirido após o casamento.

Mas será que é isso mesmo? A questão será melhor pontuada a seguir.

I – Como funciona o regime da separação de bens?

Sabe-se que os nubentes, antes de se casarem, podem estipular um regime de bens. Regime este que será aplicado sobre o patrimônio então existente e, ainda, sobre o futuro patrimônio dos nubentes.

Os nubentes podem estabelecer quaisquer regras, como bem entenderem. Sejam aqueles regimes que se apresentam no Código Civil, sejam outros não previstos.

No caso do regime da separação de bens, esses bens permanecem sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que pode alienar ou gravar de ônus real esses bens (art. 1.687, Código Civil).

Na separação de bens, os bens de cada um são de cada um. Ou seja, o patrimônio de um dos cônjuges não se comunica com o do outro. De modo que, havendo uma separação, cada qual continua com seu patrimônio. Para isso, deve ser feito um pacto antenupcial (art. 1.640, parágrafo único do Código Civil) com essas regras.

II – Como funciona a separação obrigatória de bens?

Ultrapassada a questão acima, há situações em que a lei obriga os nubentes que contraiam casamento sob o regime da separação de bens. Razão pela qual a lei se refere a separação obrigatória ou legal de bens.

Portanto, os nubente deve, obrigatoriamente, se casar pelo regime da separação de bens quando:

  • contrair o casamento sem observar as causas suspensivas da celebração do casamento. Cite-se o exemplo (todos previstos no art. 1.523, Código Civil) segundo o qual o divorciado, enquanto não realizada sua partilha de bens, deve contrair novo casamento obrigatoriamente pelo regime da separação legal de bens.
  • um dos nubentes for maior de 70 (setenta) anos;
  • se depender de suprimento judicial para casar: é o caso, por exemplo, em que um dos genitores nega autorização ao filho menor de idade de se casar. A falta de consentimento do genitor pode ser suprida por ordem judicial. Ou seja, o menor de idade, caso um dos pais se negue a autorizar o casamento, pode obter autorização judicial para tanto. De modo que esse casamento será através do regime da separação legal de bens.

Algumas dessas causas suspensivas sofrem críticas por parte de alguns juristas. No entanto, o presente artigo não se presta a tratar dessas divagações doutrinárias. Assim, passa-se a tratar de como se aplicaria a Súmula do STF nesses casos.

III – Mas afinal, o que diz a Súmula 377 do STF e como ela se aplicaria ao caso?

Segundo a Súmula 377 do STF,

No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.

Observe que a Súmula menciona especificamente o regime de separação legal de bens. Ou seja, aquele regime em que os nubentes têm de “optar obrigatoriamente” pela separação de bens. Em momento algum a lei faz menção ao regime da separação (convencional) de bens.

Não à toa que a própria jurisprudência mineira deixa claro que há uma clara diferenciação entre o regime da separação de bens (previsto nos arts. 1.687 e 1.688 do Código Civil) e o regime da separação obrigatória de bens (art. 1.641, Código Civil), vejamos:

EMENTA: APELAÇÃO – REGIME DA SEPARAÇÃO LEGAL DE BENS –
ART. 1.641, I, DO CC/2002 (ART. 258, PARÁGRAFO ÚNICO, I, DO CC/1916) – PARTILHA – SÚMULA Nº 377 DO STF – PRINCÍPIO DA COMUNICABILIDADE DOS BENS ADQUIRIDOS DURANTE O CASAMENTO – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. É sabido que o regime da separação total de bens, previsto nos arts. 1.687 e 1.688 do CC/2002 (arts. 276 e 277 do CC/1916), não se confunde com o regime da separação obrigatória de bens, previsto no art. 1.641 do CC/2002 (art. 258, parágrafo único, I, do CC/1916), também regulado pelo teor da súmula nº 377 do STF em que os bens adquiridos na constância do casamento devem ser partilhados em proporção igualitária. 2. Recurso não provido.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0429.14.000576-1/001, Relator(a): Des.(a) Audebert Delage , 6ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 24/09/2019, publicação da súmula em 04/10/2019)

São regimes distintos que devem ser também tratados de maneiras distintas. De forma que, a nosso ver, não se poderia aplicar o teor da Súmula 377 do STF aos casamentos contraídos pelo regime da separação convencional de bens.

Aliás, a própria jurisprudência mineira possui o entendimento do afastamento da Súmula 377 do STF em casamentos contraídos pelo regime da separação (convencional) de bens, veja-se:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL – CASAMENTO – REGIME DE BENS – PACTO ANTENUPCIONAL – REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL E ABSOLUTA DE BENS – AFASTAMENTO DA SÚMULA 377 DO STF – PREVALÊNCIA SOBRE O REGIME DE SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS.
1. O regime da separação convencional e absoluta de bens afasta a aplicação da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal.
2. O regime de separação convencional e absoluta de bens, constante em pacto antenupcial, deve prevalecer sobre o regime da separação obrigatória de bens.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0000.19.048708-2/001, Relator(a): Des.(a) Carlos Henrique Perpétuo Braga , 19ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 18/07/2019, publicação da súmula em 24/07/2019)

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE PARTILHA DE BENS – DIVÓRCIO – CASAMENTO REALIZADO EM REGIME DE SEPARAÇÃO CONVENCIONAL – SÚMULA 377 DO STF – INAPLICABILIDADE – PARTILHA DOS AQUESTOS – DESCABIMENTO – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Pelo regime da separação de bens, cada cônjuge é responsável pela administração do seu patrimônio, conservando-se na posse e na propriedade dos bens que trouxer para o casamento, inexistindo, a princípio, a comunicabilidade dos aquestos. 2. Entretanto, com o escopo de evitar o enriquecimento sem causa, a súmula 377 do Supremo Tribunal Federal preconiza que, no regime de separação obrigatória de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento(aquestos), considerando que os nubentes não tiveram oportunidade de manifestar sua vontade. 3. Todavia, o enunciado não incide no caso do casamento realizado sob o regime de separação convencional, em observância ao princípio da autonomia da vontade, devendo prevalecer a escolha do casal em pacto antenupcial, salvo se verificada a existência de vício do negócio jurídico. 4. No caso concreto, não havendo alegação de vício de consentimento ou formal no pacto antenupcial, celebrado livremente entre as partes, que estabeleceu o regime da separação de bens, incabível a meação dos aquestos. 5. Sentença mantida. 6. Recurso não provido.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0349.10.001237-7/001, Relator(a): Des.(a) Raimundo Messias Júnior , 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 26/02/2019, publicação da súmula em 08/03/2019)

Desta feita, fica bem claro que, pelo texto da Súmula, ela se aplica tão somente ao regime de separação legal (obrigatória) de bens. De forma que não seria aplicada ao regime da separação de bens (convencional). Leia-se, aquele regime em que as partes, por livre vontade, estabelecem, através de pacto antenupcial, que o patrimônio de cada um ficará apartado.

IV – Então de maneira alguma haveria comunicação de bens no regime da separação convencional?

Em que pese o entendimento acima, há decisões do tribunal paulista que têm admitido a comunicação de bens no casamento contraído pelo regime da separação convencional de bens, quando há o esforço comum do casal, veja-se:

DIVÓRCIO C.C. PARTILHA DE BENS. Ação proposta pelo cônjuge varão. Partes que concordaram com o divórcio, tendo a ação prosseguido, apenas, no que tange à partilha de bens. Sentença de improcedência, em razão das partes serem casadas pelo regime da separação convencional de bens e tendo em vista que as questões sobre os bens são estranhas ao matrimônio, tratando-se de negócios jurídicos concluídos à margem dele, devendo ser discutidos em ações autônomas. Inconformismo do autor. Partes que celebraram pacto antenupcial estabelecendo o regime convencional da separação total de bens. Artigos 1.687 e 1.688, ambos do Código Civil, que dispõem que nesse regime não haverá a comunicação de qualquer bem, seja posterior ou anterior à celebração do casamento. Jurisprudência, todavia, que vem admitindo a comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento pelo esforço comum do casal, se comprovada a existência da sociedade de fato. Pretensão, todavia, que deve ser buscada em ação própria, perante o juízo cível. Precedentes. Sentença mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. 

(TJSP;  Apelação Cível 1000773-90.2019.8.26.0445; Relator (a): Ana Maria Baldy; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de Pindamonhangaba – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/10/2020; Data de Registro: 05/10/2020)

Assim, tem-se admitido que, se amplamente comprovado que o cônjuge casado pelo regime da comunhão convencional concorreu diretamente, com capital ou trabalho, para aquisição de bens em nome do outro cônjuge, é cabível a atribuição de direitos àquele consorte.

Mas note que a decisão acima não leva em conta a aplicação da Súmula do STF. Somente mitiga a regra referindo-se ao esforço comum do casal. De modo que a Súmula permanece inaplicável aos casos em que o matrimônio é contraído sob o regime da separação convencional de bens.

V – Conclusão

Por fim, se por um lado a jurisprudência mineira considera inaplicável a Súmula 377 nos casamentos contraídos pelo regime da separação convencional de bens, por outro lado o tribunal paulista tem admitido, em alguns casos, a comunicação do patrimônio quando ficar amplamente comprovado que o consorte contribuiu para a aquisição dos bens.

Portanto, ao contrário do que fora noticiado pela mídia, não se pode aplicar a Súmula 377 do STF aos casamentos contraídos pelo regime da separação convencional de bens. Caso contrário, estaríamos expostos a enorme insegurança jurídica.

Assim, a nosso ver qualquer entendimento pela comunicação com a aplicação da Súmula seria equivocado. Em primeiro, porque a Súmula do STF é clara ao se referir especificamente ao regime da separação legal (obrigatória) de bens. Em segundo, porque a partir do momento que os nubentes escolhem o regime da separação convencional de bens, eles o fazem de maneira livre. De acordo com a autonomia de sua vontade. Ou seja, tomam essa decisão sabendo das consequências da escolha do regime.

Julgamento sobre Código Florestal prossegue na sessão plenária desta quinta-feira (22)

fev 22, 2018

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) dará continuidade, na sessão desta quinta-feira (22), ao julgamento de cinco ações que tratam do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012). Três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 4901, 4902 e 4903) foram apresentadas pela Procuradoria-Geral da República e uma (ADI 4937) pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Todas pedem a inconstitucionalidade do novo Código Florestal por variadas alegações, especialmente quanto à redução da reserva legal. Já a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC ) 42 foi ajuizada pelo Partido Progressista (PP) e, ao contrário das ADIs, defende a constitucionalidade da lei por considerar que o novo Código não agride o meio ambiente, mas tem o objetivo de preservá-lo. Até o momento, apresentaram seus votos os ministros Luiz Fux, relator, Marco Aurélio e a presidente, ministra Cármen Lúcia.   Fonte: STJ