O que é indisponibilidade de bens imóveis?

jan 17, 2019

Na negociação de imóveis, é de extrema importância o conhecimento – seja pelo corretor de imóveis, pelo vendedor ou comprador ou mesmo pelo estudioso do direito – de uma figura chamada indisponibilidade de bens. Talvez o leitor já tenha verificado esta situação na prática: ao pesquisar a documentação do imóvel que está sendo vendido, verifica-se uma averbação na matrícula daquele imóvel indicando que está indisponível. Mas afinal, o que seria a chamada indisponibilidade de bens imóveis e a que ela se destina na prática do mercado imobiliário? O presente artigo pretende explicar estas e outras questões, a seguir. I – O que é indisponibilidade de bens imóveis? A lei dá ao proprietário de um imóvel o direito de usar, gozar e dispor da coisa, bem como reivindicá-la de quem injustamente a possua. Ou seja, na prática o proprietário pode usar aquele imóvel ou alugá-lo a terceiros, podendo inclusive receber alugueis pela locação. Pode também vender aquele bem, no exercício de seu direito de proprietário. O direito de o proprietário dispor da coisa – por exemplo, o direito de alienar um bem ou até mesmo dar o bem em garantia – é um dos atributos da propriedade. Ou seja, é um dos direitos que possui o titular da propriedade de um bem. No entanto, existem algumas situações em que o proprietário perde o direito de dispor, por determinação legal, judicial ou administrativa. A indisponibilidade é, portanto, a restrição do poder de o proprietário de dispor da coisa (vendê-lo ou onerá-lo). Ela impede que o proprietário venda o imóvel, por exemplo.  II – Para que serve a indisponibilidade? A indisponibilidade pode ser útil em diversas situações. A título de exemplo de sua utilização, cite-se situação em que o devedor inadimplente, no curso de ação judicial, poderia dilapidar seu patrimônio para que determinado imóvel de sua propriedade não respondesse pela dívida. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a indisponibilidade de bens é uma medida excepcional e só pode ser conferida no caso de ficar comprovada situação de perigo, quando é justificável o receio de dilapidação do patrimônio ou desvios de bens. Portanto, é possível que, por segurança, o juiz ordene que determinado imóvel se torne indisponível. O que pode ser feito, inclusive, como medida liminar em processos judiciais. Ou seja, logo no início do processo. III – Como saber se um imóvel está indisponível? Para verificar se sobre um imóvel existe o gravame da indisponibilidade, o interessado deve comparecer ao cartório de registro de imóveis competente (aquele da localidade do imóvel) e pedir uma certidão da matrícula do imóvel. Neste documento é possível verificar todo o “histórico” daquele imóvel. Se houver indisponibilidade, será possível saber. No entanto, e já indo além da pretensão do presente artigo, para quem atua no mercado imobiliário e negocia imóveis, não basta que o interessado verifique somente se um imóvel encontra-se indisponível. É preciso, ainda, que o interessado examine processos judiciais em nome do proprietário (e cônjuge) daquele imóvel. Isto porque pode ser que existam ações judiciais em curso que podem desencadear gravames ao imóvel, tais como a penhora do imóvel ou mesmo sua indisponibilidade. Portanto, não obstante a importância da consulta à matrícula do imóvel, não é o bastante. É preciso que o interessado tenha cautelas outras, como consultar um advogado especialista em direito imobiliário para que realize a due dilligence imobiliária, investigação minuciosa que visa a segurança daquela negociação. Situação que não é possível explorar neste espaço, cujo objeto de estudo se restringe a indisponibilidade de bens. IV –  O que é o sistema CNIB? O sistema CNIB (Central Nacional de Indisponibilidade de Bens) é um sistema de alta disponibilidade, criado e regulamentado pelo Provimento Nº 39/2014, da Corregedoria Nacional de Justiça e se destina a integrar todas as indisponibilidades de bens decretadas por Magistrados e por Autoridades Administrativas. O CNIB tem como objetivos dar eficácia e efetividade às decisões judiciais e administrativas de indisponibilidades de bens, divulgando-as para os Tabeliães de Notas e Oficiais de Registro de Imóveis de todo o território nacional e para outros usuários do sistema. E proporcionar segurança aos negócios imobiliários de compra e venda e de financiamento de imóveis e de outros bens. Assim, antes de promover quaisquer atos nos cartórios, cumpre aos tabeliães de notas a consulta ao CNIB, conforme art. 160, §6º do Provimento 260 da Corregedoria Geral de Justiça de Minas Gerais (Código de Normas do Extrajudicial de MG), veja-se:
§ 6º Os tabeliães de notas e os oficiais de registro civil com atribuição notarial, antes da prática de qualquer ato notarial que tenha por objeto bens imóveis ou direitos a eles relativos, exceto a lavratura de testamento, deverão consultar a base de dados da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens – CNIB, consignando no ato notarial o resultado da pesquisa e o respectivo código gerado (“hash”), dispensado o arquivamento do resultado da pesquisa em meio físico ou eletrônico.
Portanto, através deste sistema se realiza um verdadeiro rastreamento de todos os bens que o atingido pela indisponibilidade possui em território nacional, evitando a dilapidação do patrimônio, atuando como importante ferramenta no combate ao crime organizado e na recuperação de ativos de origem ilícita. V – Qual lei trata sobre a indisponibilidade de bens? A possibilidade de indisponibilidade de bens está presente em diversas legislações, como por exemplo no caso da execução trabalhista (art. 889 da CLT e 185-A do CTN); na Recuperação Judicial e Falência (Lei 11.101/05); quando se fala de improbidade administrativa, em ação civil pública (lei 8.429/92); investigação de CPIs (art. 58, §3º, CF); Poder cautelar geral (art. 796 e seguintes do CPC), dentre outros. No caso específico da indisponibilidade de bens imóveis, a Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73) estabelece, em seu art. 247, o seguinte:
“Averbar-se-á, também, na matrícula, a declaração de indisponibilidade de bens, na forma prevista na Lei”.
Sabe-se que o documento principal de um imóvel é sua matrícula, documento em que está registrado todo o “histórico” do imóvel (quem é o proprietário, se o imóvel está penhorado, se é bem de família, se foi inventariado, etc). Assim, caso exista ordem judicial ordenando que determinado imóvel se torne indisponível, o julgador irá oficiar o cartório de registro de imóveis competente mandando que averbe, na matrícula do imóvel, a indisponibilidade. Daí a importância do estudo da certidão atualizada da matrícula do imóvel, visando sempre a segurança nas negociações imobiliárias. VI – A importância de conhecer a indisponibilidade para quem opera no mercado imobiliário O conhecimento do instituto da indisponibilidade de bens, sobretudo dos imóveis, é de suma importância para quem opera no mercado imobiliário. Sejam, corretores de imóveis, investidores, advogados que atuam na área ou até mesmo proprietários de imóveis, todos devem entender a que se destina o instituto. O que faz com que os operadores do mercado imobiliário atuem visando garantir maior segurança e cautela na negociação de imóveis.        

O direito de preferência do locatário na alienação fiduciária

jul 16, 2018

Questão relevante a ser tratada é sobre o direito de preferência do locatário na locação de imóveis quando o imóvel está gravado com alienação fiduciária. Para demonstrar a questão, é preciso antes explicar do que se trata o direito de preferência do locatário. Nas locações de imóveis o locatário possui direito de preferência para adquirir o imóvel locado. Ou seja, caso pretenda o proprietário vender o imóvel, é preciso que antes ele ofereça ao locatário. Tudo, nos termos do art. 27, vejamos:
Art. 27. No caso de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de direitos ou dação em pagamento, o locatário tem preferência para adquirir o imóvel locado, em igualdade de condições com terceiros, devendo o locador dar lhe conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial ou outro meio de ciência inequívoca.
Portanto, para a venda do imóvel é preciso que o proprietário ofereça ao locatário em iguais condições com terceiros. O locatário, por sua vez, tem o prazo de 30 dias para se manifestar sobre a compra do imóvel. Isto, de maneira inequívoca. Pois bem, resta agora demonstrar do que se trata a alienação fiduciária de bem imóvel. De maneira direta, é uma espécie de garantia comumente utilizada no mercado imobiliário. A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa alienada. O devedor se torna possuidor direto. Para melhor entendimento, aquele que adquire o imóvel pode utiliza-lo, mas o imóvel ficará gravado com a cláusula da alienação fiduciária. Como consequência, caso aquele que tenha adquirido o bem não pague as prestações do financiamento, o imóvel retorna para a propriedade do banco. Que, por sua vez, pode leva-lo a leilão. É importante observar que este procedimento de retomada do imóvel é muito eficiente e rápido. Sobre este procedimento, veja-se um artigo em meu blog (https://fellipeduarte.adv.br/2017/11/27/entenda-o-procedimento-da-alienacao-fiduciaria-de-imovel-apos-a-lei-13-465-17/). Ultrapassada a questão introdutória, é preciso observar algumas questões específicas referentes a locação do imóvel objeto de alienação fiduciária, senão vejamos. Quando o locador não cumpre com o pagamento das prestações do financiamento imobiliário, pelo regime da alienação fiduciária a propriedade se consolida nas mãos do credor fiduciário (o banco, por exemplo). Da consolidação, em regra a locação poderá ser denunciada no prazo de 30 dias para desocupação. Mas o contrato poderá ser denunciado no prazo de 90 dias da consolidação na propriedade do fiduciário, caso se este tiver aquiescido. Porém, para a aplicação do prazo de 90 dias é preciso que esta condição esteja especificada em cláusula contratual (art. 27, §7º da Lei 9.514/97). Outra questão que deve ser observada é que, caso haja locação de imóvel ou sua prorrogação por prazo superior a um ano, sem a concordância por escrito do fiduciário, esta situação será considerada ineficaz e sem qualquer efeito perante o fiduciário. O que significa que caso não haja concordância do fiduciário, se o locador não pagar as prestações do financiamento o fiduciário poderá denunciar o contrato de locação, conforme demonstrado acima. Lado outro, se o contrato de locação estiver registrado no cartório de registro de imóveis, o fiduciário será obrigado a observar todas as suas condições. Inclusive, aquele que adquirir o imóvel em público leilão deverá observar o contrato em todos os seus termos. Aqui, abre-se um parêntese para uma questão importante: como fica o direito de preferência do locatário nestes casos? Com a consolidação na propriedade do fiduciário e a realização de público leilão, o locatário não tem direito de preferência. Ocorre que após quitado o imóvel pelo devedor fiduciante, caso sejam observados os requisitos legais, terá o locatário seu direito de preferência. Retornando à questão do registro do contrato de locação, os registradores têm exigido algumas condições para seu registro. A primeira, é que se conste, no bojo do contrato, cláusula específica informando que o imóvel está sob alienação fiduciária e que, por isso, não haveria direito de preferência enquanto estiver alienado (art. 23, parágrafo único, Lei 8.245/91). A segunda exigência é a de que se conste, no contrato de locação, cláusula com o seguinte teor: “se o imóvel estiver locado, a locação poderá ser denunciada com o prazo de trinta dias para desocupação, salvo se tiver havido aquiescência do fiduciário, devendo a denúncia ser realizada no prazo de noventa dias a contar da data da consolidação da propriedade no fiduciário”. Ademais, conforme a jurisprudência, para o registro de contrato de locação com cláusula de vigência superior a um ano, é preciso que haja a anuência do credor fiduciário, conforme art. 37-B da Lei 9.514/97 e jurisprudência:
“Registro de imóveis – Dúvida – Contrato de locação com clausula de vigência superior a um ano – Alienação fiduciária sobre o imóvel locado – Necessidade a anuênciadocredorfiduciárioparaoregistrodalocação-Artigo37Bda Lei nº 9.514/97. Recusa do oficial adequada Recurso não provido” (Conselho Superior da Magistratura, na Apelaçãono 0065836-57.2013.8.26.0100).
E não é demais lembrar que para que o futuro adquirente respeite o contrato de locação até seu término, é preciso que esteja expresso no contrato cláusula de vigência e que seja averbado na matrícula do imóvel. Diante das considerações feitas, é preciso que o interessado em alugar um imóvel o faça com cautela, de maneira que durante a negociação o interessado procure estudar a documentação referente ao imóvel. E quanto ao credor fiduciário, caso não queira correr o risco da locação, deverá impor como condição à alienação fiduciária o cancelamento do registro da locação antes da constituição da garantia fiduciária. Caso não o faça, correrá o risco de se submeter aos dispositivos da locação do imóvel.