Dicas sobre o aluguel de imóveis para escolas e hospitais

jun 17, 2019

Muitas vezes os contratos de locação de imóveis são elaborados com base em modelos retirados da internet ou sem observar algumas peculiaridades sobre cada tipo de empreendimento. Além do que esses contratos muitas vezes são elaborados por pessoas que desconhecem a legislação aplicável. Tendo em vista este fato, é importante tratar de uma espécie de locação específica. Aquela locação para imóveis onde serão instalados estabelecimentos de ensino, de saúde, unidades sanitárias e asilos. Nestes casos específicos, é preciso ressaltar que a Lei confere uma proteção especial a estas instituições, tendo em vista seu relevante valor social. Esta proteção está descrita no art. 53 da Lei nº 8.245/91:
Art. 53 – Nas locações de imóveis utilizados por hospitais, unidades sanitárias oficiais, asilos, estabelecimentos de saúde e de ensino autorizados e fiscalizados pelo Poder Público, bem como por entidades religiosas devidamente registradas, o contrato somente poderá ser rescindido. (Redação dada pela Lei nº 9.256, de 9.1.1996) I – nas hipóteses do art. 9º; (estas hipóteses são: I – por mútuo acordo; II – em decorrência da prática de infração legal ou contratual; III – em decorrência da falta de pagamento do aluguel e demais encargos; IV – para a realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário no imóvel ou, podendo, ele se recuse a consenti – las). II – se o proprietário, promissário comprador ou promissário cessionário, em caráter irrevogável e imitido na posse, com título registrado, que haja quitado o preço da promessa ou que, não o tendo feito, seja autorizado pelo proprietário, pedir o imóvel para demolição, edificação, licenciada ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de cinqüenta por cento da área útil.
Trocando em miúdos, diz a lei que a locação para estas instituições somente poderá ser rescindida em casos específicos. E somente nestes casos. Passa-se a tratar de cada um destes casos, em tópicos: I – Por mútuo acordo O mútuo acordo, como o próprio nome diz, seria um acordo de ambas as partes visando o distrato da locação. Nenhum empecilho, já que ambos estariam distratando. Com o perdão da redundância, seria o “distrato por acordo entre as partes”. II – Em decorrência da prática de infração legal ou contratual Caso o locatário (a escola ou o hospital, por exemplo) descumpra uma cláusula prevista em contrato, ou ainda a lei, será possível o desfazimento do contrato pelo locador. Por conta desta cláusula, é recomendável que o contrato seja o mais completo possível. Ou seja, que ele preveja as mais variadas obrigações ao locatário. III – Em decorrência de falta de pagamento de alugueis ou demais encargos Neste caso, obviamente que se o locatário deixar de pagar o aluguel ou qualquer de seus acessórios, o contrato poderá ser rescindido. IV – Para a realização de reparações urgentes determinadas pelo Poder Público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário no imóvel ou, podendo, ele se recuse a consenti – las. V – Se o proprietário, promissário comprador ou promissário cessionário, em caráter irrevogável e imitido na posse, com título registrado, que haja quitado o preço da promessa ou que, não o tendo feito, seja autorizado pelo proprietário, pedir o imóvel para demolição, edificação, licenciada ou reforma que venha a resultar em aumento mínimo de cinqüenta por cento da área útil. Neste caso, um exemplo é o do adquirente do imóvel que, com os requisitos preenchidos, precise demolir, edificar ou mesmo reformar o imóvel, desde que esta aumente ao menos 50% de sua área útil. Mas e se o contrato estiver por prazo indeterminado? Suponha que determinada locação seja de 4 anos e que o contrato já tenha expirado, de forma que a locação esteja por prazo indeterminado. Neste caso, poderia o locatário pedir o imóvel de volta através da chamada denúncia vazia? A proteção que a lei confere neste tipo de locação é tão grande que o Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento que a locação não pode ser rescindida por denúncia vazia. Veja esta decisão:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.237.386 – SP (2018/0002727-0) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO AGRAVANTE : COLÉGIO AUGUSTO LARANJA LTDA ADVOGADO : LEVI CORREIA – SP309052 AGRAVADO : IPATEC – INSTITUTO PAULISTA DE CIENCIA, CULTURA E TECNOLOGIA ADVOGADO : LAILA MARIA BRANDI – SP285706 DECISÃO 1. Trata-se de agravo interposto pelo COLÉGIO AUGUSTO LARANJA LTDA., contra decisão que não admitiu o seu recurso especial, por sua vez manejado com fulcro no art. 105, III, a, da Constituição Federal, em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado (fl. 380): AÇÃO DE DESPEJO POR DENÚNCIA VAZIA. IMÓVEL LOCADO PARA ESTABELECIMENTO DE ENSINO. DESCABIMENTO. ART. 53, DA LEI N.º 8.245/91. Se o pacto locativo foi firmado com estabelecimento de ensino é vedada a retomada por denúncia vazia. (…) Portanto, considerando-se que o pacto locativo foi firmado com estabelecimento de ensino, é vedada a retomada por denúncia vazia. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o estabelecimento de ensino autorizado e fiscalizado pelo Poder Público tem proteção legal contra a retomada por denúncia vazia, em face do seu relevante valor social. (STJ – AREsp: 1237386 SP 2018/0002727-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ 26/06/2018)
Agora suponha que o locador queira vender o imóvel a terceiro. Neste caso, o adquirente do imóvel poderia retirar o locatário? Ou seja, poderia o adquirente denunciar o contrato? Vejamos, em regra a locação pode ser denunciada pelo adquirente, nos termos do art. 8º da lei do inquilinato:
Art. 8º Se o imóvel for alienado durante a locação, o adquirente poderá denunciar o contrato, com o prazo de noventa dias para a desocupação, salvo se a locação for por tempo determinado e o contrato contiver cláusula de vigência em caso de alienação e estiver averbado junto à matrícula do imóvel.
Ocorre que caso a locação seja para os estabelecimentos constantes no rol do art. 53, como escolas, asilos e afins, a jurisprudência também não tem permitido o desfazimento do contrato por denúncia vazia. A este respeito, numa interpretação a contrario sensu, veja-se decisão de Minas Gerais:
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE DESPEJO – LITISPENDÊNCIA – INEXISTÊNCIA – CERCEAMENTO DE DEFESA – JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE – LOCAÇÃO – DESPEJO – CLÍNICA MÉDICA – DENÚNCIA VAZIA – POSSIBILIDADE. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO, PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDO. I – O julgamento antecipado da lide é possível, a teor do artigo 330, I, do estatuto processual. II – Não há falar-se em cerceamento de defesa, nos casos em que os documentos acostados se apresentarem suficiente para formar o convencimento do julgador. III – Estabelecimento de saúde, para fins da proteção inserta no artigo 53 da Lei do Inquilinato, é aquele em que se faz internação, excluídos os utilizados apenas para consultas ou tratamento meramente ambulatorial. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. IV – Em relação ao pedido de retenção/indenização das benfeitorias, não está o adquirente obrigado a pagar por algo que não contratou. V – Recurso conhecido, preliminares rejeitadas e não provido.  (TJMG –  Apelação Cível  1.0702.07.391019-3/001, Relator(a): Des.(a) Bitencourt Marcondes , 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 29/10/2008, publicação da súmula em 28/11/2008)
No caso acima avaliado, entendeu-se permitida a denúncia vazia, por conta de a clínica médica não preencher os requisitos de estabelecimento de saúde do art. 53. Lado outro, na locação para estabelecimentos como hospitais credenciados e fiscalizados pelo poder público não poderia o adquirente denunciar o contrato, ainda que esta denúncia fosse após o prazo do contrato ter vencido. Ultrapassada a questão acima, é preciso ainda esclarecer que quando houver o despejo de estabelecimentos de ensino autorizados e fiscalizados pelo poder público, o prazo para a desocupação será no mínimo de 6 meses e deverá coincidir com o período de férias escolares, nos termos do art. 63, §2º da lei do inquilinato.    

Como funciona o aluguel de imóveis em Shopping Center?

nov 19, 2018

Situação que pode gerar dúvidas, sobretudo a locatários, é sobre a locação de imóveis em shopping center. Este breve artigo pretende demonstrar como funcionam as locações comerciais nos shopping center. De forma que as questões serão tratadas a seguir, em tópicos. I – Natureza das locações em Shopping Center Inicialmente,  para o entendimento da matéria é importante dizer que a relação locatícia estabelecida entre o empreendedor e o locatário é uma relação que resulta em um contrato atípico, permitido pela lei, veja-se o teor do art. 425 do Código Civil:
“É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.”
O que significa dizer que se trata de um contrato que não é regulamentado especificamente pela lei, mas que não é por ela proibido, quando não contraria-la. Aliás, o Superior Tribunal de Justiça também possui o entendimento que os contratos de locação em shopping center são atípicos (REsp nº 178908). Neste sentido, é importante observar o teor do art. 54 da Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/91), segundo a qual:
“Nas relações entre lojistas e empreendedores de shopping center , prevalecerão as condições livremente pactuadas nos contratos de locação respectivos e as disposições procedimentais previstas nesta lei”.
Desta forma, prevalecerão as condições livremente pactuadas entre lojistas e shopping center. As cláusulas contratuais são respeitadas com base no chamado princípio do “pacta sunt servanda, segundo o qual deve-se cumprir exatamente o que foi estipulado em contrato. Diante disso, é preciso entender exatamente o que pode e o que não pode ser tratado nessa espécie de contrato. O que será demonstrado a seguir. I – O que pode e o que não pode prever o contrato Ultrapassada a análise da natureza do contrato de locação em shopping center e claro, sem pretender esgotar o assunto, é preciso salientar o que pode ou não estar previsto nesses contratos. a) A cobrança de décimo terceiro aluguel ou aluguel dúplice Como se sabe, nestes contratos os shopping center costumam cobrar um décimo terceiro mês a título de aluguel. Ou seja, normalmente existem cláusulas que dobram o valor do aluguel em dezembro de cada mês. Acerca da legalidade destas cláusulas, verifica-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 54 DA LEI DE LOCAÇÕES. COBRANÇA EM DOBRO DO ALUGUEL NO MÊS DE DEZEMBRO. CONCREÇÃO DO PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA. NECESSIDADE DE RESPEITO AOS PRINCÍPIOS DA OBRIGATORIEDADE (“PACTA SUNT SERVANDA”) E DA RELATIVIDADE DOS CONTRATOS (“INTER ALIOS ACTA”). MANUTENÇÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS LIVREMENTE PACTUADAS. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (…) 3. Concreção do princípio da autonomia privada no plano do Direito Empresarial, com maior força do que em outros setores do Direito Privado, em face da necessidade de prevalência dos princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da função social da empresa. 4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ – REsp: 1409849 PR 2013/0342057-0, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 26/04/2016, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/05/2016)
Neste sentido, tendo sido a cláusula de cobrança do aluguel dúplice livremente pactuada, deve-se respeita-la. Assim, ao contrário das locações comuns previstas pela lei do inquilinato, nas locações de shopping center os empreendedores passam a gozar de vantagens como esta. b) a cobrança de “luvas” A Lei do Inquilinato (lei 8.245/91) prevê a possibilidade da cobrança das “luvas” na assinatura do contrato de locação, desde que seja dado ao locatário o direito à renovatória, conforme seu art. 45, veja-se:
“São nulas de pleno direito as cláusulas do contrato de locação que visem a elidir os objetivos da presente lei, notadamente as que proíbam a prorrogação prevista no art. 47, ou que afastem o direito à renovação, na hipótese do art. 51, ou que imponham obrigações pecuniárias para tanto”.
E a jurisprudência também possui o entendimento de que é possível a cobrança das chamadas “luvas”, de forma que
“a Lei nº 8.245/91, em seu art. 45, veda, expressamente, a cobrança de “luvas” obrigações pecuniárias – quando da renovação do contrato. Contudo, silencia, ao contrário da legislação anterior (Dec. 24.150/34), no que se refere ao contrato inicial. Não há, pois, qualquer proibição, sequer implícita, quanto à sua cobrança. Não afasta esse entendimento o disposto no art. 43 da Lei nº 8.245/91, pois o dispositivo veda a cobrança de valores além dos encargos permitidos e não a expressamente elencados. Assim, apesar de não se fazer referência às “luvas” iniciais para permiti-las, tampouco se faz para proibi-las, o que, em termos obrigacionais, tendo em conta a liberdade contratual, faz concluir pela possibilidade da cobrança de valor sob esse título. Recurso provido. (REsp 406.934/RJ, Relator o Ministro Félix Fischer, QUINTA TURMA, DJ 22/04/2002, p. 253)
Ocorre que deve ser observado o prazo de 5 anos para a cobrança de “luvas”. Isto porque antes deste prazo não existe o direito a ação renovatória, razão pela qual não poderia haver a incidência das “luvas” em locação inferior a este prazo. c) a cobrança de aluguel com base nas vendas do locatário Nos contratos de imóveis em shopping center, normalmente o aluguel é determinado da seguinte forma: aluguel mínimo e aluguel em percentual sobre as vendas. Quanto ao aluguel mínimo, é aquele que normalmente se pratica no mercado imobiliário. Quanto ao aluguel por percentual sobre o faturamento, também chamado de “aluguel de desempenho” ou “aluguel percentual”, é aplicado sobre o faturamento bruto da loja, sendo devido quando exceder o aluguel mínimo e naquilo que o ultrapassar. Quanto a esta forma de cobrança, se estiver prevista em contrato e se não houver ilegalidade, não há que se falar em proibição de sua cobrança, veja-se:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RENOVATÓRIA DE LOCAÇÃO EM SHOPPING CENTER. (..) 3 – Existindo expressa previsão contratual e não sobressaindo ilegalidade dos termos pactuados em avença de locação de unidade comercial no tocante à fórmula de cálculo do valor do aluguel mínimo nos casos de renovação do contrato, deve ser prestigiado o princípio da obrigatoriedade do contrato, pacta sunt servanda, não subsistindo a pretensão de declaração de nulidade das cláusulas impugnadas. (…) (TJ-DF – APC: 20100111362058 DF 0045336-09.2010.8.07.0001, Relator: ANGELO CANDUCCI PASSARELI, Data de Julgamento: 15/10/2014, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 20/10/2014 . Pág.: 223) 
Portanto, é preciso que as cláusulas estejam previstas no contrato para sua validade. Diante das colocações acima, surge a pergunta: A liberdade do empreendedor é irrestrita? Ou seja, pode ele estabelecer quaisquer cláusulas? Esta liberdade que possui o empreendedor com base no chamado “pacta sunt servanda” encontra limitação no chamado princípio da “função social” do contrato. Este princípio, previsto no Código Civil de 2002, passou a elevar o interesse coletivo sobre o interesse individual. Assim, a liberdade que o empreendedor possui nestas espécies de contrato podem ser restringidas quando houver, nestes contratos, cláusulas que coloquem uma das partes em desvantagem desproporcional e exagerada. Ou, ainda, quando houver qualquer cláusula que desequilibre o contrato. Desta forma, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se posicionou sobre a possibilidade de o Poder Judiciário reconhecer a abusividade de cláusulas previstas nestas espécies de contrato:
DIREITO CIVIL. SHOPPING CENTER. INSTALAÇÃO DE LOJA. PROPAGANDA DO EMPREENDIMENTO QUE INDICAVA A PRESENÇA DE TRÊS LOJAS-ÂNCORAS.DESCUMPRIMENTO DESSE COMPROMISSO. PEDIDO DE RESCISÃO DO CONTRATO. 1. Conquanto a relação entre lojistas e administradores de Shopping Center não seja regulada pelo CDC, é possível ao Poder Judiciário reconhecer a abusividade em cláusula inserida no contrato de adesão que regula a locação de espaço no estabelecimento, especialmente na hipótese de cláusula que isente a administradora de responsabilidade pela indenização de danos causados ao lojista. (STJ – REsp: 1259210 RJ 2011/0061964-0, Relator: Ministro MASSAMI UYEDA, Data de Julgamento: 26/06/2012, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/08/2012)
Portanto, não obstante a liberdade do empreendedor estipular cláusulas que o beneficiem, é preciso ter cautela, de forma a não prejudicar o locatário. A não colocá-lo em desvantagem desproporcional. Na dúvida, é importante a consulta de um advogado especialista em direito imobiliário. Profissional este que será capaz de analisar a legalidade do contrato e emitir um parecer sobre a negociação.