Como fugir do georreferenciamento de imóveis rurais?

fev 19, 2022

Se você chegou aqui, provavelmente está diante da seguinte situação: precisa vender seu imóvel ou, ainda, precisa realizar alguma questão relativa a seu imóvel e, portanto, precisa realizar o georreferenciamento do imóvel. Sendo ou não sendo esta sua situação, o presente artigo tratará sobre o chamado georreferenciamento e trará, talvez, uma saída para postergar sua realização.

Antes de entrar na questão, ressalto que não existe fórmula mágica. Mas com o profundo conhecimento da legislação e o conhecimento sobre o tema, além da prática notarial e registral, é possível solucionar questões de maneira mais simplificada.

Pois bem. Passamos ao tema de maneira didática, como de costume, para que haja a correta compreensão do leitor.

I – O que é georreferenciamento de imóvel?

O georreferenciamento de imóvel é basicamente um procedimento para definição da forma, dimensão e localização do imóvel, através de levantamento topográfico.

O chamado “geo” foi criado para que fossem eliminadas falhas de levantamentos topográficos antigos, como a sobreposição de áreas junto aos cartórios de registro de imóveis. Essa situação gerava muitas discussões jurídicas e uma certa insegurança aos proprietários.

Portanto, a Lei 10.267 de 2001, alterando alguns dispositivos de outras legislações, trouxe a necessidade da realização do georreferenciamento nos casos de desmembramento, parcelamento ou remembramento de imóveis rurais.

Seu regulamento (Decreto 4.449/2002) trouxe, portanto, a obrigatoriedade do procedimento conforme o tamanho da área. Assim, a cada dia que passa, mais imóveis têm de se submeter ao geo, a saber:

Já vigente para imóveis acima de 250 hectares;

Já vigente para os imóveis com área entre 100 a menos de 250 hectares;

20/11/2023 para os imóveis com área de 25 a menos de 100 hectares;

20/11/2025 para os imóveis com área inferior a 25 hectares.

Dessa forma, se você está lendo esse artigo no ano de 2.022 e se seu imóvel tem entre 25 e 100 hectares, você ainda não está obrigado realizar o geo. Se seu imóvel já tem mais de 100 hectares, já deve realizar o procedimento.

II – Como funciona o georreferenciamento?

De maneira prática, para a realização do procedimento é preciso procurar um profissional técnico (profissional especializado em topografia rural). Esse profissional elaborará uma planta e um memorial descritivo e submeterá a questão ao INCRA.

Para que o procedimento ocorra, é necessário que a planta seja assinada pelos confrontantes diretos (art. 9º, §6º, Dec. 4449/02). Ou seja, aqueles proprietários vizinhos diretos do imóvel que está sendo georreferenciado.

E é justamente a necessidade das assinaturas que, muitas vezes, atrasa sobremaneira o procedimento. Porque enquanto a planta não é completamente assinada pelos confrontantes, ela não entra no cartório de registro de imóveis.

III – É possível a realização do geo sem a assinatura dos confrontantes?

Embora o Decreto 4449/02 tenha trazido a necessidade de anuência dos titulares de direito real confrontantes do imóvel para a realização do geo, a Lei 13.838/2019 alterou a Lei de Registros Públicos para dispensar a anuência dos confrontantes nos casos de desmebramento, parcelamento e remembramento de imóveis rurais.

A questão é instigante, mas como o objetivo do presente artigo não é o aprofundamento da referida dispensa, a questão não será tratada aqui.

Passo, então, ao questionamento que dá o título do artigo.

IV – Como fugir do georreferenciamento?

Verificado todo o contexto acima, existe uma forma de o proprietário “fugir” da realização do georreferenciamento.

O proprietário do imóvel cujo tamanho (no caso do ano de 2022, mais de 100 hectares) já seja exigido o georreferenciamento não conseguirá se aproveitar dessa fuga. Portanto, se este é seu caso, o georreferenciamento é obrigatório.

No entanto, para aquele proprietário de imóveis menores, é possível se utilizar desta fuga. A questão, em uma leitura rasa, pode parecer óbvia. Afinal, se não está no prazo, não há fuga. Apenas não estaria no prazo.

No entanto, há aqueles casos em que o imóvel possui 150 hectares e possui vários coproprietários. Neste caso, se seu Zé das Couves é dono de 12 hectares dentro de um todo (em uma única matrícula), ele não poderia vender seu imóvel a terceiros, uma vez que o registrador de imóveis deve considerar o tamanho total da gleba para interpretar a lei do geo.

Assim, seu Zé das Couves não conseguirá registrar a compra e venda da área de 12 hectares dentro de uma gleba de 150 hectares. Ainda que seja possível lavrar essa escritura, o cartório de registro de imóveis apresentará uma nota devolutiva (um documento explicando que não é possível registrar a compra e venda) exigindo a realização do georreferenciamento.

Mas neste caso, seu Zé da Couves consegue fugir do chamado georreferenciamento. Como? Através da estremação do imóvel. Sob qual fundamento? Para efeitos de estremação de imóvel, há recomendação de que o cartório de registro de imóveis deve considerar o tamanho do imóvel a ser estremado, e não o tamanho do todo (conforme enunciado nº 39 do Colégio Registral Imobiliário de Minas Gerais).

V – O que é estremação?

A estremação (com “S” mesmo) é um procedimento extrajudicial (portanto, não há necessidade de ir para a justiça) em que o proprietário em condomínio pode separar sua parte da matrícula em condomínio. Já escrevi sobre esse tema em meu blog, aqui (embora o artigo esteja desatualizado, consegue explicar bem o procedimento).

Nesta situação, se uma matrícula possui 15 coproprietários, um deles pode realizar uma estremação para sair dessa matrícula. Oportunidade em que se cria uma nova matrícula para esse coproprietário. Daí, seu imóvel será uma matrícula separada com um tamanho inferior àquele da matrícula maior.

No caso de seu Zé das Couves, ele sairia de uma matrícula de 150 hectares para uma matrícula de 12 hectares. Estaria, portanto, fora do prazo para o georreferenciamento. O que o possibilitaria de vender o imóvel sem que o cartório de registro de imóveis exija o procedimento.

VI – A estremação é possível em todo o Brasil?

Você pode estar se questionando que no seu Estado não haveria regulamentação para a estremação. Afinal, a estremação nasceu no Rio Grande do Sul e, atualmente, não possui regulamentação em todos os Estados da Federação.

No entanto, com a entrada em vigor da Lei 13.465/17 e a vinda da Reurb (também já escrevi sobre isso aqui), é possível sim a realização da estremação. Só que neste caso o procedimento passaria necessariamente pelo Município e pelo Cartório de Registro de Imóveis. Ficando a questão, assim, submetida a uma análise mais pormenorizada da legislação municipal.

VII – Conclusão

O tema comentado acima não está nítido na legislação. Portanto, não se trata de questão simples de ser realizada. Assim, se faz relevante procurar um profissional especialista na área para que os procedimentos sejam corretamente conduzidos e haja êxito na regularização.

Fellipe Duarte é advogado especialista e com atuação exclusiva em Direito Imobiliário, Notarial e Registral. Presidente da Comissão de Direito Notarial e Registral da OAB/MG, subseção Juiz de Fora; co-autor das obras “O direito notarial e registral em artigos, vol IV”, Editora YK e “Atos eletrônicos em notas e registros”, do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário.

www.fellipeduarte.adv.br

Quais os cuidados para a compra de um imóvel rural?

maio 03, 2021

A compra de imóvel no Brasil envolve uma série de cuidados, como a verificação de diversas certidões para que haja segurança jurídica na aquisição. No caso dos imóveis rurais, os cuidados são ainda mais necessários, pois a legislação traz uma série de peculiaridades.

Desta forma, no presente artigo, sem a pretensão de se esgotar o tema, serão trazidos alguns cuidados necessários antes de se adquirir um imóvel rural.

1 – Verifique a matrícula do imóvel

Essa regra serve para todo e qualquer imóvel. Todos os imóveis possuem um registro no Cartório de Registro de Imóveis de sua competência. A primeira questão a ser verificada é retirar, no cartório em questão, uma certidão da matrícula daquele imóvel e verificar: primeiro, se o imóvel pertence a quem realmente o está vendendo.

Afinal, só o proprietário pode vender o imóvel. Caso quem lhe pretenda vender não seja o proprietário (aquele que consta na matrícula), provavelmente ele só tem a posse do imóvel. E certamente não pode, sozinho, realizar essa venda.

A segunda questão que se pode observar na matrícula e no contrato de promessa de compra e venda desse imóvel é se o imóvel que vai ser vendido respeita a fração mínima de parcelamento. Questão que será melhor explicada em seguida.

Aliado a matrícula, é preciso verificar uma série de certidões, como a CND da Receita Federal, a Certidão de quitação do ITR (Imposto territorial rural), dentre outras.

2 – Observe a Fração Mínima de Parcelamento

A fração mínima de parcelamento é a menor área que um imóvel rural pode ser parcelado em determinada região. Em Juiz de Fora/MG, por exemplo, a fração mínima é de 2 hectares, o que corresponde a 20 mil metros quadrados. Portanto, só se pode vender e registrar o tamanho que corresponde a esta medida.

O leitor pode estar se perguntando como as pessoas compram e vendem imóveis rurais com metragem inferior a este tamanho. Vamos tentar esclarecer.

Regra geral, a compra e venda somente ocorre quando é lavrada a Escritura Pública no Tabelionato de Notas. Afinal, pela regra do art. 108 do Código Civil, “não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País”. Esse montante, atualmente, é cerca de R$ 33.000,00. E dificilmente existem, no país, imóveis com valores inferiores a este.

Portanto, esses contratos particulares intitulados “Contrato de Compra e Venda” na verdade são verdadeiras promessas de compra e venda. Significa dizer que nesses contratos as partes prometem vender, não vendem efetivamente. Porque a venda somente ocorre na escritura pública.

Nesses contratos, nos casos dos imóveis rurais, as partes prometem vender imóveis rurais com áreas inferiores à fração mínima de parcelamento. Ocorre que esse negócio não pode ser efetivado no Tabelionato de Notas, pelo fato de o negócio estar desrespeitando a fração mínima de parcelamento, que está prevista nos art. 65 da Lei Federal 4.504/1964 (Estatuto da Terra) e art. 8º da Lei Federal 5.868/1972.

Portanto, negócios como esses são inseguros do ponto de vista jurídico. Com o contrato particular se transmite a posse. Porém o registro continua em nome do proprietário originário.

3 – O georreferenciamento

Com o fim de se evitar a sobreposição de imóveis rurais, é necessário que o proprietário do imóvel rural realize um procedimento chamado georreferenciamento.

Trata-se de um procedimento que visa definir a forma, a dimensão e a localização, através de levantamento topográfico que toma as coordenadas geográficas do imóvel conhecidas em um dado sistema de referência.

O georreferenciamento é realizado por um engenheiro especializado em topografia rural e é obrigatório a todos os imóveis rurais.

Portanto, é importante observar se o imóvel a ser adquirido já foi georreferenciado. E caso não tenha sido, é preciso observar os prazos legais pra que seja realizado o georreferenciamento. Os prazos foram estabelecidos originariamente pelo Decreto 4.449/2002.

Os prazos para o georreferenciamento são:

20/11/2021 para imóveis com áreaa de 25 a menos de 100 hectares;

20/11/2025 para os imóveis com área inferior a 25 hectares.

Atente-se para o fato de que, caso já tenha se esgotado o prazo para o georreferenciamento de determinado imóvel, o registro da compra e venda somente será efetivado caso seja antes realizado o georreferenciamento daquele imóvel.

Portanto, é preciso verificar essa questão antes de se adquirir um imóvel rural.

4 – A questão ambiental

Uma das questões mais relevantes quando se fala em imóvel rural é verificar as questões ambientais que o envolvem.

A) CAR – Cadastro Ambiental Rural

A primeira delas é observar se determinado imóvel foi inscrito no chamado Cadastro Ambiental Rural. Vulgarmente conhecido como CAR. O CAR é um registro público eletrônico obrigatório para todos os imóveis rurais. E tem como finalidade integrar as informações ambientais referentes à situação das áreas de preservação permanente, das áreas de reserva legal, das florestas e dos remanescentes de vegetação nativa, das áreas de uso restrito e das áreas consolidadas das propriedades e posses rurais do país.

Visto o que é o CAR, pergunta-se: qual seria o prejuízo de o imóvel rural não possuir o cadastro?

A ausência de inscrição do imóvel no CAR poderá acarretar restrição ao acesso do proprietário a alguns benefícios previstos na lei, como:

– Possibilidade de regularização das Áreas de Proteção Permanente (APP) e/ou Reserva Legal e vegetação natural suprimida ou alterada até 22/07/2008 no imóvel rural, sem autuação por infração administrativa ou crime ambiental (art. 59§ 2º c/c § 4º, Lei Federal nº 12.651/12);

– Obtenção de crédito agrícola, em todas as suas modalidades, com taxas de juros menores, bem como limites e prazos maiores que o praticado no mercado (art. 41, inciso II, alínea ‘a’, Lei Federal nº 12.651/12);

– Contratação do seguro agrícola em condições melhores que as praticadas no mercado (art. 41, inciso II, alínea ‘b’, Lei Federal nº 12.651/12);

– Dedução das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Territorial RuralITR, gerando créditos tributários (art. 41, inciso II, alínea ‘c’, Lei Federal nº 12.651/12);

– Linhas de financiamento para atender iniciativas de preservação voluntária de vegetação nativa, proteção de espécies da flora nativa ameaçadas de extinção, manejo florestal e agroflorestal sustentável realizados na propriedade ou posse rural, ou recuperação de áreas degradadas (art. 41, inciso II, alínea ‘e’, Lei Federal nº 12.651/12);

– Isenção de impostos para os principais insumos e equipamentos, tais como: fio de arame, postes de madeira tratada, bombas d’água, trado de perfuração do solo, dentre outros utilizados para os processos de recuperação e manutenção das Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito (art. 41, inciso II, alínea ‘f’, Lei Federal nº 12.651/12), e; 

– Suspensão de sanções em função de infrações administrativas por supressão irregular de vegetação em áreas de APP, Reserva Legal e de uso restrito, cometidas até 22/07/2008 (art. 14§ 2º, Lei Federal nº 12.651/12).

Portanto, este é outro ponto relevante a ser verificado pelo interessado em adquirir imóvel rural.

B) Área de Preservação Permanente

Não é incomum que dentro de imóveis rurais existam Áreas de Preservação Permanente. As chamadas APPs estão previstas do Código Florestal e são áreas protegidas, cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas (art. 3º, II Lei 12.651/12).

As áreas de preservação permanente são tratadas pelo art. 4º e seguintes do Código Florestal e são extremamente relevantes. O adquirente do imóvel rural deve observar se no imóvel que pretende adquirir existe área de preservação permanente e, principalmente, se existem construções ilegais nessas áreas.

A título de exemplo, cite-se um imóvel com um curso d’água de menos de 10 metros de largura que passa pelo imóvel rural. Segundo a lei, a faixa de 30 metros desse curso d’água é considerada APP e não se pode intervir nela sem a autorização do órgão ambiental competente (dependendo da intervenção, é considerado crime pela lei de crimes ambientais).

Caso tenha algo tenha sido construído nessa APP pelo promitente vendedor do imóvel, é preciso observar quando foi realizada a construção, sob pena de o adquirente daquele imóvel responder pelo passivo ambiental. Afinal, a obrigação ambiental é obrigação propter em, o que significa dizer que acompanha a coisa.

C) Autuações ambientais

Outra questão ambiental relevante é verificar se o proprietário daquele imóvel possui autuações ambientais nos órgãos ambientais competentes, como o IBAMA, o órgão ambiental federal e o órgão ambiental municipal. Caso existentes, deve-se verificar como ficariam eventuais multas incidentes sobre o imóvel e constar essas questões em contrato.

CONCLUSÃO

As questões acima são só alguns dos cuidados que se deve ter com esse tipo de aquisição. É preciso ressaltar que a compra de um imóvel rural é ainda mais complexa que a aquisição de imóveis urbanos e deve envolver uma atenção especial, sobretudo por um advogado especialista em direito imobiliário com conhecimento em imóveis rurais.

Reurb em "imóvel rural" é possível?

out 29, 2019

A Regularização Fundiária Urbana – REURB – é um tema muito recente, que veio à tona com a conversão da Medida Provisória nº 759/2016 na Lei nº 13.465/17. Esta lei não só simplificou o procedimento da regularização fundiária urbana (trazendo algumas alterações à Lei nº 11.977/09), com a REURB, como também trouxe várias modificações relevantes no Direito Imobiliário. Não obstante os diversos institutos e a riqueza de detalhes da lei, atenta-se, mais uma vez, para a questão da Reurb. Sobretudo no que tange a regularização de imóveis rurais. Diante disso, pergunta-se: seria possível a aplicação da Reurb em imóveis rurais? E para tratar desta questão, como de praxe, passa-se ao estudo através de tópicos, que serão vistos a seguir. I – O que afinal é a REURB? A título introdutório, é preciso explicar melhor do que se trata a REURB. Pois bem, a sigla indica Regularização Fundiária Urbana. Mas o que seria isso? Basicamente, a Reurb é um conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais destinadas à incorporação dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano e à titulação de seus ocupantes. Trata-se de uma política pública que tem como finalidade regularizar núcleos informais. Assim, grosso modo, havendo núcleo urbano informal (exemplo, loteamentos irregulares), caso se encaixem nos critérios da lei, é possível sua regularização através de um procedimento extrajudicial. De forma que, dentre os objetivos da Reurb, evidencia-se aquele de identificar os núcleos urbanos informais que devam ser regularizados, organizá-los e assessorar a prestação de serviços públicos aos seus ocupantes, de modo a melhorar as condições urbanísticas e ambientais em relação à situação de ocupação informal anterior. II – Quais os tipos de REURB? A lei trouxe dois tipos de Reurb, quais sejam:
  1. REURB-S: Reurb de interesse social. Aqui são incluídas as ocupações por pessoas de baixa renda, com finalidade residencial, que receberão gratuitamente o registro do imóvel e toda a infraestrutura básica por conta do Poder Público.
  2. REURB-E: Reurb de interesse específico. Neste caso, o particular deverá custear toda a infraestrutura a ser definida no projeto de regularização da região.
Para as famílias de baixa renda, o próprio Município “toca” o projeto, não havendo despesas para essa população. Nos demais casos, não considerados de baixa renda, o interessado será o responsável pelas despesas com a Reurb. De forma que ele deve arcar com emolumentos de cartório, eventuais despesas com engenheiros para elaboração de projetos técnicos e advogados. III – Quem pode requerer a REURB? Segundo a lei, podem requerer a Reurb:
  • a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, diretamente ou por meio de entidades da administração pública interna;
  • os seus beneficiários, individual ou coletivamente, diretamente ou por meio de cooperativas habitacionais, associações de moradores, fundações, organizações sociais, organizações da sociedade civil de interesse público ou outras associações civis que tenham por finalidade atividades nas áreas de desenvolvimento urbano ou regularização fundiária urbana;
  • os proprietários de imóveis ou de terrenos, loteadores ou incorporadores;
  • a Defensoria Pública, em nome dos beneficiários hipossuficientes;
  • o Ministério Público.
Uma vez que a lei visa garantir o direito social à moradia, deve-se entender o rol acima como exemplificativo. De forma que outros interessados, que não os do rol acima, podem requerer a Reurb. IV – Onde dar entrada na REURB?  Para iniciar a Reurb é preciso dar entrada junto ao Município. Cada Município vai regulamentar a Reurb, criando uma legislação específica com regras específicas. Portanto, deve-se dar entrada na Reurb no órgão competente no âmbito Municipal. V – É possível REURB em imóvel Rural? Para verificar a possibilidade de aplicação da Reurb a imóveis rurais, é preciso verificar alguns pontos da Lei, vejamos o art. 11, parágrafo 6º:
§ 6º Aplicam-se as disposições desta Lei aos imóveis localizados em área rural, desde que a unidade imobiliária tenha área inferior à fração mínima de parcelamento prevista na Lei no 5.868, de 12 de dezembro de 1972 .
Da leitura acima, verifica-se que a Reurb se aplica a imóveis localizados em área rural, desde que o módulo rural seja menor que a fração mínima de parcelamento. Quando a lei fala em “módulo rural”, leia-se o lote. Ou seja, em um loteamento, por exemplo, o lote deve ser menor que essa fração mínima de parcelamento. Quanto a fração mínima de parcelamento, essa é a menor área em que um imóvel rural pode ser desmembrado num determinado Município. Ou seja, existe uma fração mínima de parcelamento que o imóvel rural deve observar. Assim, se a unidade imobiliária (o lote) for menor que esta fração, é possível a aplicação da Reurb. Além disso, o Decreto nº 9.310/18, que regulamentou a Reurb, estabelece o seguinte conceito de núcleo urbano, em seu art. 3º, I:
assentamento humano, com uso e características urbanas, constituído por unidades imobiliárias com área inferior à fração mínima de parcelamento prevista no art. 8o da Lei no 5.868, de 12 de dezembro de 1972 , independentemente da propriedade do solo, ainda que situado em área qualificada ou inscrita como rural;
Daí se compreende que núcleos urbanos, ainda que situados em área inscrita como rural, com a unidade imobiliária inferior à fração mínima de parcelamento, é passível de Reurb. Mas observe que este núcleo deve ter uso e características urbanas. O que seriam essas características urbanas? A Lei nº 13.465/17, ao tratar da REURB, não indicou o que seriam essas características urbanas. De modo que a lei se contenta em indicar que é possível a REURB em imóveis localizados em área rural, cujo módulo seja inferior a fração, desde que com características urbanas. O que deixa a cargo do Município a opção por deferir ou não o procedimento da Reurb nesses casos. No entanto, é possível se utilizar de critérios de outras legislações para se ter um norte sobre o que seriam essas características urbanas. Sugestão de critérios para considerar o imóvel com características urbanas Poderíamos utilizar como exemplo as características que devem ter o imóvel para efeitos de cobrança de IPTU (imposto sobre a propriedade territorial e predial urbana), conforme definido pelo Código Tributário Nacional. Neste caso, para a cobrança do IPTU o imóvel deve ter sua localização em área urbana e ter, no mínimo, duas das seguintes infraestruturas: a) meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; b) abastecimento de água; c) sistema de esgotos sanitários; d) rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;  e) escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de três quilômetros do imóvel considerado. Outro critério que poderia ser levado em consideração é aquele da Lei nº 9.636/98 relativa ao patrimônio da União. Naquela legislação, exige-se como condição para alienação de imóveis sob o regime da “enfitêuse” (saiba mais sobre enfitêuse assistindo este vídeo) que estejam situados em “área urbana consolidada”, definida como aquela a) inserida no perímetro urbano; b) com sistema viário implantado e vias de circulação pavimentadas; c) organizada em quadras e lotes predominantemente edificados; d) de uso predominantemente urbano; e) com a presença de, no mínimo, três equipamentos de infraestrutura implantados. É importante, ainda, levar em consideração que são atividades típicas com características urbanas aquelas ligadas à indústria, ao comércio e de serviços. Existem outros critérios de outras legislações que poderiam ser utilizados para este efeito. Mas a questão pode ser solucionada com uma regulamentação municipal mais precisa. Veja-se a seguir. Verificado que o lote é menor que a fração mínima de parcelamento e que o imóvel tenha características urbanas, como fica a Reurb? Caso o imóvel tenha preenchido esses requisitos da Lei nº 13.465/17, o interessado pode dar entrada na Reurb em seu Município. Quando da análise do procedimento pelo Poder Público Municipal, segundo o art. 30, §2º da Lei nº 13.465/17, o Município poderá deferir (definindo a modalidade da REURB) ou indeferir o procedimento. É nesse momento que o Município avaliará se o interessado observou todos os princípios e toda a legislação vigentes para dar continuidade na Reurb. Dentre os princípios a serem observados estão todos aqueles previstos na Lei nº 13.465/17 e no Decreto nº 9.310/18, dentre os quais destaca-se o princípio da eficiência na ocupação do solo:
Art. 2º. Constituem objetivos da Reurb, a serem observados pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios:
IX – concretizar o princípio constitucional da eficiência na ocupação e no uso do solo;
Assim, para efeitos de regularização de assentamentos em zona rural, o poder público deverá fornecer serviços públicos adequados aos moradores, o que exige uma avaliação de viabilidade financeira, para que seja assegurada sua sustentabilidade econômica. Além disso, a ocupação eficiente do território é objetivo implícito do art. 182, §4º da Constituição Federal, que busca coibir o solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, com vistas à promoção de seu adequado aproveitamento. Portanto, no momento da análise do procedimento pelo Município, deve-se avaliar cada caso. Tudo, com base no critério de oportunidade e conveniência da Administração Pública. Uma vez que o Município tome a decisão de deferir a regularização fundiária em área rural, é preciso que se altere o plano diretor, de modo a ampliar o perímetro urbano. Incluindo-se, assim, o assentamento em uma zona de expansão urbana ou de urbanização específica.