Entenda o novo Minha Casa Minha Vida – MP 1162/2023

mar 22, 2023

Talvez o leitor já tenha conhecimento do novo “velho” Programa Minha Casa Minha Vida, do atual governo. Novo porque conta com novas regras. Velho, porque retoma a nomenclatura antes utilizada pelo governo.

Sabe-se que o governo Bolsonaro substituiu o Programa Minha Casa Minha Vida pelo Programa Casa Verde Amarela, trazido pela Lei 14.118/21. Tendo sido, agora, trocado o governo, voltamos ao Programa Minha Casa Minha Vida. Que será trazido por meio da Medida Provisória 1162/2023 (atualmente, na comissão mista do congresso nacional).

Mas quais serão as novas regras?

I – Quais os objetivos do programa?

Dentre os objetivos do programa estão o de ampliar a oferta de moradias para atender às necessidades habitacionais, principalmente da população de baixa renda e promover a melhoria de moradias existentes para reparar as inadequações habitacionais.

A intenção, como se sabe, é o estímulo do mercado imobiliário para a população de baixa renda. Gerando, com isso, o estímulo da economia.

II – A quem o programa se destina

O programa se destina àquelas famílias que vivem em área urbana que possuem renda mensal bruta de até R$ 8.000,00. E àquelas famílias que vivem em área rural com renda anual de até R$ 96.000,00.

No cômputo da renda mensal bruta, não serão considerados benefícios temporários de natureza indenizatória, assistencial ou previdenciária (auxílio-doença, auxílio-acidente, seguro-desemprego, benefício de prestação continuada, etc).

Mas atenção, o programa poderá ser concedido apenas uma vez para cada beneficiário, podendo ser cumulado com os descontos habitacionais e utilização de recursos do FGTS.

O programa não pode ser concedido se o interessado já for titular de contrato de financiamento utilizado com recursos do FGTS ou em condições equivalentes às do Sistema Financeiro da Habitação (art. 9º, I); se o interessado já for dono do próprio imóvel com abastecimento de água, esgotamento sanitário e com energia elétrica regular (art. 9º, II); ou tenha recebido, nos últimos 10 anos, benefícios similares do governo (art. 9º, III).

III – A mulher como prioridade

O novo programa beneficia a mulher, já que os contratos formalizados no âmbito do Minha Casa Minha Vida serão formalizados preferencialmente no nome da mulher. Caso ela seja a “chefe de família”, esses contratos poderão ser assinados sem a participação do marido. De modo que aqui, a lei afasta a necessidade do que chamamos de outorga uxória (arts. 1.647, 1.648, 1.649, do Código Civil).

Aliás, quando do registro do contrato de financiamento junto ao cartório de registro de imóveis, a lei dispensa a exigência de dados relativos ao cônjuge ou ao companheiro e ao regime de bens.

IV – Cautelas para o financiamento

Recentemente, a Folha de São Paulo noticiou recente recorde de inadimplência na faixa 1 do Programa Minha Casa, Minha Vida (veja aqui). Portanto, uma dica prática é que o interessado nesses financiamentos se organize e tome suas decisões com o pé no chão, para evitar problemas.

O incorporador pode desistir do empreendimento?

jan 14, 2020

A incorporação imobiliária é a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas. Assim, antes de se dar início às vendas das futuras unidades autônomas (de apartamentos, por exemplo), deve o incorporador arquivar a incorporação no cartório de registro de imóveis competente, apresentando diversos documentos cujo rol se encontra no art. 32 da Lei nº 4.591/64. Assim, suponha que o incorporador deu início à incorporação e lançou seu empreendimento, mas verificou que o mercado imobiliário não estava propício àquele lançamento. Sendo assim, o incorporador poderia desistir da incorporação? A questão será respondida à seguir. I – O incorporador pode desistir do empreendimento? Para responder a esta questão, é importante observar o teor do art. 34 da Lei nº 4.591/64:
O incorporador poderá fixar, para efetivação da incorporação, prazo de carência, dentro do qual lhe é lícito desistir do empreendimento
Assim, a lei dá o direito do incorporador fixar o chamado “prazo de carência”, que seria basicamente um prazo em que o incorporador poderia desistir do empreendimento. Portanto, caso estabeleça o prazo de carência, pode o incorporador desistir. II – Pode o incorporador desistir do empreendimento sem ter fixado o prazo de carência no cartório? Se o incorporador não fixou o prazo de carência no cartório ou se o fixou, sem que fosse por declaração expressa, à partir do momento em que negociar qualquer unidade imobiliária, estará o incorporador obrigado a promover a incorporação. Sendo assim, não poderá ele desistir do empreendimento. II – Como estabelecer o prazo de carência e qual seria esse prazo? O prazo de carência será estabelecido através de declaração expressa, junto ao cartório de registro de imóveis competente. O prazo em questão, segundo o art. 34, §2º da Lei nº 4.591/64, não pode ultrapassar o termo final do prazo de validade do registro. Assim, como a lei estabelece que o prazo de validade do registro é de 180 dias (art. 33 da Lei nº 4.591/64), não pode o prazo de carência superar este valor. Conta-se, pois, o prazo de carência da data do registro da incorporação imobiliária no Cartório de Registro de Imóveis competente. Portanto, o prazo de carência pode ser qualquer um, desde que não ultrapasse os 180 dias. III – A desistência do incorporador deve ter uma explicação? Na  declaração que estabelecer o prazo de carência, deverá o incorporador especificar, de forma clara e objetiva, as razões que permitirão eventual desistência da incorporação, com as quais ficará o incorporador rigorosamente vinculado. Essas razões poderiam ser, por exemplo, dificuldades jurídicas e administrativas, problemas de ordem técnica na edificação, conjuntura financeira negativa, reação negativa do mercado na aceitação ou receptividade do empreendimento imobiliário, manifestações populares organizadas contra o empreendimento, etc. IV – Uma vez estabelecido o prazo de carência, como o incorporador pode evitar problemas com o consumidor? Suponha-se que o incorporador estabeleceu, nos moldes da lei, o referido prazo e carência. Suponha-se, ainda, que algumas unidades imobiliárias foram prometidas a venda a alguns consumidores. Se o incorporador estabeleceu prazo para desistir do empreendimento, ele deve mencionar a existência do prazo em todos os documentos e materiais que envolver o empreendimento, tais como documentos preliminares e contratos. Nesses documentos deve haver cláusula expressa e destacada neste sentido (art. 32, §3º da Lei nº 4.591/64). V – Como deve ser feita a desistência? Se o incorporador efetivamente desistir, ele deve protocolar requerimento junto ao cartório de registro de imóveis. Nesta comunicação, deve constar:
  • os motivos que levaram o incorporador a desistir do empreendimento
  • os documentos que comprovem que os adquirentes foram devidamente comunicados por escrito da desistência da incorporação
  • declaração firmada pelo incorporador de que não houve celebração de nenhum documento de venda, promessa de venda ou de ajuste preliminar, etc.
  • a data e assinatura do incorporador, com firma reconhecida por tabelião de notas da localidade do imóvel
Ato contínuo, o oficial de registro averbará na matrícula do imóvel a respectiva desistência. VI – E se o incorporador quis desistir, mas já passou o prazo para a desistência? Pode ocorrer de o incorporador ter vontade de desistir do empreendimento mas deixar o prazo se esgotar. Se isso ocorrer, o proprietário do terreno pode apresentar o requerimento com a desistência, quando tiver outorgado procuração para o construtor ou o corretor de imóveis atuarem como incorporador (art. 35, §3º da Lei nº 4.591/64). Sendo assim, o proprietário do terreno terá o prazo de 5 dias para denunciar a incorporação ao oficial, contado a partir do término do período de carência. Ocasião em que o proprietário do terreno ficará solidariamente responsável com o incorporador pela obrigação de restituição aos adquirentes à aquisição dos valores pagos, com seus acréscimos legais. Isso deve constar expressamente de sua comunicação ao registro de imóveis. VII – O cancelamento da incorporação cancela automaticamente a “venda” das unidades imobiliárias? Por óbvio, o cancelamento da incorporação com a desistência do incorporador não gera o cancelamento automático das alienações. Para tanto, o registrador exigirá que o incorporador apresente os seguintes documentos:
  • rescisão comprovada do contrato, devidamente formalizada; ou
  • requerimento conjunto das partes contratantes, se capazes, com firmas reconhecidas;
  • decisão judicial transitada em julgado
VIII – Conclusão Diante de tudo que foi explicado acima, o incorporador pode usar o prazo de carência para “testar o mercado”, uma vez que a denúncia da incorporação dentro desse prazo é medida de avaliação da viabilidade do negócio.

Entenda o procedimento da Alienação Fiduciária de Imóvel após a Lei 13.465/17

nov 27, 2017

I – INTRODUÇÃO No dia 17/07/2017 foi sancionada a Lei nº 13.645/2017, que modificou diversas outras leis na área do Direito Imobiliário. Dentre as modificações e inovações, a nova lei trouxe a figura do condomínio de lotes, inseriu a figura do direito real de laje e modificou as regras da alienação fiduciária de imóvel. Neste artigo vou tratar especificamente sobre as novas regras da alienação fiduciária de imóveis. Antes de explicar o tema, é importante observar que as modificações da legislação facilitaram a vida das construtoras e incorporadoras, de modo que o procedimento ficou mais rigoroso e duro para aquele que compra o imóvel, caso se torne inadimplente com as obrigações. Note que em momento algum ocorre a participação do Poder Judiciário. Ou seja, o procedimento de cobrança não vai parar na justiça, nas mãos de um Juiz. Tudo é feito de forma extrajudicial, no Cartório de Registro de Imóveis.  II – O QUE É ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL? Ultrapassada a introdução, é preciso esclarecer o que é a alienação fiduciária e por que é importante que você conheça as regras trazidas em Julho de 2017. Pois bem. A alienação fiduciária é uma garantia atribuída pelo devedor (fiduciante), que transfere a propriedade de seu imóvel ao credor (fiduciário), até que pague a dívida. Na prática, o devedor continua utilizando um bem que não mais lhe pertence. Uma vez paga a dívida, o devedor, automaticamente, volta ser o proprietário da garantia. Na hipótese de não pagamento do débito, o credor, titular do bem, poderá, rapidamente, reaver a posse direta das mãos do devedor e efetuar a execução da garantia, alienando-a. Note que é diferente da hipoteca, procedimento em que há a necessidade da participação do Poder Judiciário. Quando se compra um imóvel na planta, por exemplo, este instituto tem sido muito utilizado por sua segurança e celeridade. A Lei que regula o procedimento é a Lei nº 9.514/1997.   III – PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL NO CASO DE INADIMPLEMENTO – CONSIDERANDO AS ALTERAÇÕES DA NOVA LEI Para efeito ilustrativo, imagine-se que o devedor (fiduciante) não paga em dia suas prestações de seu financiamento imobiliário (sendo utilizado da alienação fiduciária de imóvel). Após o vencimento e ultrapassado o eventual prazo de carência concedido em contrato, ocorre a constituição em mora do fiduciante, de modo que ele é notificado pra pagar em 15 dias todos os valores, juros, penalidades, encargos, tributos, condomínios e despesas de cobrança. E quando se menciona todos os valores, leia-se os vencidos e os que se vencerem até a data do pagamento, conforme o art. 26, §1º da Lei 9.514/97. A notificação é realizada através do Oficial de Registro de Imóveis, que poderá delegar a atribuição ao Oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio do notificado. De forma que o próprio oficial do cartório (de registro de imóveis ou de títulos e documentos) vai “notificar” o devedor do pagamento da dívida. E se o devedor se esconder, se ocultar de alguma forma? A Lei 13.465/17 trouxe uma regra nova, segundo a qual quando o oficial houver procurado o devedor por duas vezes sem o encontrar, se houver suspeita de ocultação, ele poderá intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no próximo dia útil, retornará ao imóvel para efetuar a intimação, na hora que designar. E no caso de condomínios com controle de acesso (portaria), a intimação indicada acima poderá ser feita ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência. Note que mesmo que o devedor se esquive de receber a intimação, não é possível alegar seu desconhecimento. Trata-se de uma medida que facilita o procedimento. É possível, também, a citação por edital. O Oficial do cartório (Registro de Imóveis) publicará por 3 (três) dias em jornal local de grande circulação a citação do devedor, valendo como citado. Após os 15 dias, há dois caminhos. O não pagamento da dívida ou o pagamento no cartório (purgação da mora no registro de imóveis). Caso ocorra o pagamento no cartório, nos 3 dias seguintes, ocorre a entrega dos valores ao fiduciário, descontadas as despesas de cobrança e intimação. No caso de financiamento com recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (inclusive Minha Casa Minha Vida), a consolidação da propriedade se dá em 45 dias, levando-se em conta os 15 dias da notificação e 30 dias previstos no art. 26-A, §1º da Lei. No caso do não pagamento pelo devedor, ocorre a consolidação da propriedade em nome do fiduciário com o pagamento do ITBI e, se for o caso, do laudêmio. O que quer dizer que se o devedor (aquele que comprou o bem) não pagar, no próprio cartório ocorrerá o procedimento para que a propriedade volte para aquele que “vendeu” o imóvel. Uma vez consolidada a propriedade em nome do fiduciário, em 30 dias este promoverá público leilão para a alienação do imóvel. De modo que o imóvel ira a leilão para sua venda. O primeiro leilão será pelo valor do imóvel indicado no contrato ou sobre o valor de referência para o ITBI, o que for maior (inovação do art. 39, parágrafo único da Lei). Se neste primeiro leilão o maior valor oferecido for inferior ao valor do imóvel ( na forma do dispositivo anterior) será feito um segundo leilão em até 15 dias do primeiro. Este segundo, pelo valor mínimo do saldo devedor total e despesas, consideradas incluídas no valor as benfeitorias, que não dão direito de retenção. Caso o valor da arrematação seja superior ao da dívida e das despesas, ocorre a entrega do valor que sobejar ao devedor. Caso o valor da arrematação seja inferior ao da dívida e das despesas, fica o devedor exonerado, recebendo quitação da dívida em 5 dias. As datas e locais dos leilões serão comunicados ao devedor, mediante correspondência dirigida ao endereço constante do contrato. IV – COMO ERA ANTES DA LEI 13.465/17 Antes da entrada em vigor da Lei 13.465/17, o STJ havia alterado substancialmente o sentido da Lei 9.514/97, dificultando a recuperação do crédito. O primeiro obstáculo a dificultar a recuperação do crédito era a aplicação do Decreto Lei 70/66 e conseguinte necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data do leilão. Entendia-se que era necessária a intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial (REsp 1447687/DF e AgRg no REsp 1367704/RS). Apesar de não mais se aplicar o Decreto-Lei 70/66, a Lei 13.465/17 trouxe disciplina propria para a comunicação dos leilões, de modo que serão comunicados ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico, conforme já explicado acima (art. 27, §2º-A da Lei 9.514/97). Outro obstáculo era a purgação da mora até a assinatura da arrematação (REsp 1.433.031/DF e REsp 1447687/DF). V – CONSIDERAÇÕES FINAIS A Lei 13.465/17 chegou ao mundo jurídico em Julho de 2017 e facilitou, em muito, a vida dos profissionais que vendem imóveis se utilizando da figura da alienação fiduciária de imóvel, em especial as construtoras e incorporadoras. E dificultou a vida do comprador do imóvel, de forma que para este, é preciso saber realmente se conseguirá pagar integralmente seu financiamento imobiliário. Pois, como já afirmado, a retomada por parte da construtora é célere e dispensa a utilização da justiça.