Quando se adquire um imóvel na planta de uma construtora, esse adquirente muitas vezes está realizando seu sonho. O sonho de ter a casa própria. Da assinatura desse contrato inicial até a entrega das chaves, é sabido que as partes passam por uma burocracia em que, muitas vezes, é necessária a contratação de profissional jurídico/burocrático.
Como se não bastasse toda a burocracia inicial, pode ser que ocorram problemas após a entrega do imóvel. Chamo, aqui, a atenção para os vícios construtivos. São defeitos da construção que podem causar prejuízos aos adquirentes.
Imagine-se, por exemplo, um imóvel novo que conta com uma infiltração recorrente, que pode chegar a gerar prejuízos na saúde do morador. Ou, ainda, um imóvel com problemas em sua fundação, situação que pode levar a insegurança na moradia.
A abordagem dos vícios construtivos junto à construtora é necessária para que o adquirente tenha um produto com qualidade e segurança. Mas é preciso ter clareza sobre onde exatamente está o vício. Afinal, a construção de um edifício é tarefa complexa, que envolve diversos profissionais, prestadores de serviço e fornecedores.
Neste breve artigo, serão trazidas algumas questões sobre os vícios construtivos.
I – O que é o vício construtivo
De maneira geral, são aqueles defeitos da construção. Como exemplo, cita-se a utilização de acabamento defeituoso, má qualidade de materiais empregados na obra, etc.
II – Vício aparente
O vício aparente é aquele de fácil constatação. Ou seja, pelo simples olhar é possível identificar o defeito.
III – Vício oculto
Vício oculto é aquele que não se constata facilmente. Que se manifesta após certo tempo de uso do produto. Imagine-se a utilização de um encanamento furado. Ao longo do tempo, a constatação desse defeito só será feita com a utilização do imóvel, ocorrendo infiltração.
IV – Qual o prazo de garantia da obra?
Com relação à existência de vícios construtivos, a legislação estabelece alguns critérios para a obtenção da garantia.
Inicialmente, o art. 618, do Código Civil, estabelece que “nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo”.
E continua, em seu parágrafo, que “decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito”.
Pela leitura do dispositivo, tem-se que a reclamação com relação ao vício deve ser realizada em até 180 (cento e oitenta) dias após o aparecimento do defeito.
Mas quando se trata de adquirente que compra o imóvel para seu uso, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, que garante ao adquirente que o prazo para que ele reclame do vício começa a contar do momento em que fica evidenciado o defeito (art. 26, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor).
Assim, do ponto de vista do consumidor, a construtora deve observar os prazos para sanar os vícios construtivos. Mas do ponto de vista de ambos – tanto do construtor quanto do consumidor – é importante observar as normas técnicas relativas àquele contexto. Passa-se, portanto, a tratar dessa questão.
V – NBR 17.170 – Prazos e diretrizes da construção civil
Inicialmente, é preciso esclarecer que a norma técnica não tem força de lei. Ou seja, não se pode vincular a solução jurídica ao que menciona a norma técnica. No entanto, trata-se de um importante instrumento que norteia as construtoras para a realização da obra.
E é neste sentido que, em dezembro do ano de 2.022, foi lançada a NBR 17.170, da ABNT, em evento que contou com a participação de diversas entidades representativas dos setores da construção civil. A referida norma técnica trouxe diretrizes para que o mercado estabeleça condições, prazos e garantias em edificações. O documento foi elaborado pelo Comitê Brasileiro de Construção Civil (ABNT/CB-02), pela comissão de estudos de Garantias das Edificações.
A norma técnica passa a nortear os prazos de garantia tecnicamente recomendados relativos aos defeitos. Os prazos trazidos pela norma são de 1, 3 e 5 anos, conforme a espécie do vício. A título de exemplo, com relação a desgaste e rupturas de suportes de pisos elevados em ambientes internos e externos e estrutura para pisos de vidro, a norma traz o prazo tecnicamente recomendado de 3 (três) anos. Já com relação aos rodapés, a norma recomenda o prazo de 1 (um) ano.
A norma é rica em detalhes técnicos e foi um grande avanço para a classe da construção civil e, ainda, um documento que também servirá para nortear o consumidor ao tratar de questões relativas a vícios construtivos.
VI – Mas o que fazer diante de um vício construtivo?
Ao receber o imóvel, o recomendável é sempre que o consumidor procure a construtora para que solucione a questão do defeito de forma amigável. Caso essa conversa inicial não seja possível, recomenda-se encaminhar à construtora uma notificação extrajudicial para que as tratativas sejam iniciadas fora da justiça.
A notificação serve para mostrar a boa-fé do consumidor (que ele está tentando, de fato, solucionar o problema) e para documentar a tentativa da solução.
Uma outra sugestão, caso a questão mereça uma mediação mais profissional, é a utilização dos mediadores judiciais dos tribunais de justiça, através de um procedimento de reclamação pré-processual. Nesse procedimento, não se está iniciando um processo, apenas se vai utilizar um mediador do tribunal para que as partes cheguem a um acordo.
Somente em último caso é recomendável a utilização do poder judiciário.
No mais, recomenda-se fortemente que o interessado (seja o consumidor, seja a construtora) procure um advogado especialista na área para que tenha condições de lidar com a situação de modo a não ter prejuízo.