Adjudicação compulsória será feita no cartório

jun 04, 2022

O tema do momento no Direito Imobiliário brasileiro é a aprovação da Medida Provisória 1085/2021, que pretende a alteração de diversas legislações imobiliárias, notariais e registrais.

No momento da produção desse artigo, o texto da Medida Provisória foi remetido para veto ou sanção presidencial. Espera-se, claro, que seja sancionado.

O texto é rico em detalhes e altera diversas questões. Mas pretende-se tratar aqui da possibilidade da realização de adjudicação compulsória através do cartório.

Esse assunto já foi objeto de explanação neste BLOG, quando se abordou acerca do Projeto de Lei nº 10046/18, que retiraria a adjudicação compulsória da exclusividade do poder judiciário (leia aqui).

Mas agora a questão veio novamente à tona com a MP 1085/21, como será tratado em seguida.

I – O que é adjudicação compulsória?

Imagine-se que João celebra com Carlos um contrato de promessa de compra e venda relativo a um imóvel. De modo que João promete a venda desse imóvel para Carlos. Com o tempo, João some do mapa ou, ainda, deixa de assinar a escritura pública de compra e venda para a transmissão do imóvel para Carlos.

Sem que João assine a escritura pública de compra e venda para Carlos, não é possível a realização da compra e venda daquele imóvel. Resta a Carlos procurar o poder judiciário para solucionar seu problema.

Sem entrar no mérito de demais formas de regularização desse imóvel, um dos caminhos é o da adjudicação compulsória. Carlos, através de ação judicial, requer ao juízo que ordene a transmissão do imóvel. De modo que, grosso modo, a sentença teria força de escritura pública.

Pois com a entrada em vigor da MP 1085/21, passará a ser possível a realização desse procedimento nos cartórios, como será verificado em seguida.

II – Como se dará o procedimento no cartório?

O texto da MP insere o art. 216-B na Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), que possibilita a adjudicação compulsória extrajudicial. Poderão, assim, requerê-la, o promitente comprador ou qualquer dos seus cessionários ou promitentes cessionários, ou ainda seus sucessores.

Para o procedimento, o pedido deve ser instruído com:

  • a) instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão;
  • b) prova do inadimplemento, ou seja, da não celebração do título de transmissão da propriedade no prazo de 15 dias da notificação;
  • c) ata notarial lavrada por tabelião de notas;
  • d) certidões dos distribuidores que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo aquele contrato objeto da adjudicação;
  • e) comprovante de pagamento do ITBI
  • f) procuração com poderes específicos

Apresentada a documentação junto ao registro de imóveis competente, o oficial procederá com o registro do domínio em nome do promitente comprador, servindo de título a respectiva promessa de compra e venda ou de cessão.

Como tudo que é realizado nos cartórios, qualquer desavença entre as partes poderá levar o procedimento ao judiciário. Portanto, em eventual conciliação a ser realizada no cartório, havendo impugnação, a questão passará a ser tratada pelo poder judiciário.

O tema provavelmente será regulamentado pelo CNJ e pelas Corregedorias dos Estados.

Trata-se, a nosso ver, de um grande avanço para a sociedade.

Fellipe Duarte é advogado especialista e com atuação exclusiva em Direito Imobiliário, Notarial e Registral. Presidente da Comissão de Direito Notarial e Registral da OAB/MG, subseção Juiz de Fora; co-autor das obras “O direito notarial e registral em artigos, vol IV”, Editora YK; “Atos eletrônicos em notas e registros” e “Questões atuais do direito ambiental: uma visão prática”, ambos do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário.

Adjudicação Compulsória poderá ser realizada nos cartórios

out 29, 2018

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 10046/18, do Deputado Sinval Malheiros, que institui a possibilidade de processo extrajudicial de adjudicação compulsória de imóveis perante cartórios de registro imobiliário. A adjudicação compulsória é uma ação destinada a promover o registro imobiliário quando não houver a escritura pública lavrada pela demora de alguma das partes no negócio. Normalmente é necessário ajuizar uma ação de adjudicação compulsória para conseguir a carta de adjudicação e, então, solicitar o registro no cartório de registro de imóveis. Se o projeto for aprovado, este procedimento poderá ser realizado de maneira extrajudicial, sem a conhecida morosidade do poder judiciário. De acordo com o autor do projeto, a proposta dá ao cidadão uma “alternativa segura, eficiente, menos custosa de realizar seus direitos”, tendo em vista as dificuldades de resolução por via judicial. O texto altera a Lei 6.015/73, a chamada Lei de Registros Públicos, inserindo dispositivo que permitirá o procedimento da adjudicação compulsória extrajudicial. O projeto de lei está alinhado com a tendência de desjudicialização pela qual tem passado o país. Com o poder judiciário abarrotado de processos, ao longo do tempo vários procedimentos que eram tratados exclusivamente no poder judiciário vem sofrendo alteração em seu “modus operandi”, passando a ser utilizados de maneira extrajudicial. Como exemplos, cite-se o inventário, o divórcio e partilha (lei 11.441/07) e a usucapião (Lei 13.105/16 – Novo Código de Processo Civil). Confira a íntegra do projeto clicando aqui   

O que fazer quando o vendedor de um imóvel não passa a escritura pública?

out 22, 2018

No mercado imobiliário, seja nas vendas de imóveis por construtoras, seja na venda de imóveis usados por pessoas físicas ou empresas, para que o adquirente de um imóvel se torne efetivamente o proprietário, é preciso que comprador e vendedor assinem a escritura pública de compra e venda e, após isto, seja realizado seu registro no cartório de imóveis competente.

Pois bem. Neste ponto, a dúvida maior é com relação àqueles negócios em que o comprador tenha efetivamente quitado todo o preço do negócio e, ao final, procurado o vendedor, este não passa a escritura pública definitiva ao comprador do imóvel.

Esta situação causa insegurança ao adquirente do imóvel, na medida em que segundo a lei só é proprietário do imóvel quando se realiza seu efetivo registro no cartório de registro de imóveis (só é dono quem registra).

Portanto, enquanto aquele vendedor não passa a escritura (para ser registrada na matrícula do imóvel), o proprietário continua sendo o vendedor daquele imóvel. No dia a dia do mercado imobiliário, não raras as vezes ocorre de compradores perderem seus imóveis pela falta de seu efetivo registro.

Diante desta situação, como deve o comprador do imóvel proceder para que o vendedor passe a escritura pública? Este artigo pretende demonstrar como agir nestas situações.

Muitas vezes se adquire um imóvel através de um contrato particular de promessa de compra e venda em que o promitente comprador se compromete a pagar pelo imóvel (pode-se mencionar em uma entrada e prestações mensais, por exemplo). Quando da quitação do preço, o promitente vendedor deve passar a escritura pública.

Para tanto, deve o comprador solicitar o termo de quitação ao vendedor e entrar em contato para que seja passada a escritura pública.

Ocorre que muitas vezes o promitente vendedor não toma as devidas providências para passar a escritura pública definitiva. Sendo assim o que pode o comprador fazer?

I – A NOTIFICAÇÃO DO PROMITENTE VENDEDOR PARA QUE PASSE A ESCRITURA PÚBLICA

Inicialmente deve o comprador entrar em contato com o vendedor, demonstrando a quitação do imóvel e pedindo que seja passada a escritura pública, para posterior registro.

Se o vendedor for uma construtora ou uma empresa de empreendimentos imobiliários, o aconselhável é que o comprador telefone para a central de atendimento e explique a situação. É importante, neste caso, que seja anotado o número do protocolo daquela ligação telefônica e o nome do atendente.

Se mesmo assim o vendedor continuar omisso, deve o adquirente daquele imóvel notificar o vendedor por carta com a viso de recebimento (correios) ou através do cartório de registro de títulos e documentos, demonstrando que todas as parcelas referentes a aquisição do imóvel foram pagas e solicitando que o vendedor, finalmente, outorgue a escritura pública de compra e venda. É importante que seja dado prazo razoável para a outorga da escritura por parte do vendedor.

Lembrando que o comprador só será o efetivo proprietário do imóvel após o efetivo registro da escritura pública no cartório de registro de imóveis competente. Antes disso, o adquirente será tão-somente (na maioria dos casos) possuidor daquele imóvel.

II – DA ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA

Ultrapassada a devida notificação, caso o vendedor não se manifeste no sentido de passar a escritura pública do imóvel, é possível que o adquirente do imóvel proponha uma ação judicial chamada Adjudicação Compulsória.

Esta ação pretende fazer com que o juiz profira uma sentença que tem por finalidade substituir a escritura pública do imóvel, de forma que esta sentença ingressará no cartório de registro de imóveis. Ou seja, o juiz dará suprimento a falta de manifestação do vendedor do imóvel.

Muitas vezes esta ação judicial pode ser realizada em conjunto com um pedido de danos morais pela demora excessiva por parte do vendedor. Em alguns casos, ainda, costuma incidir sobre o imóvel o gravame da hipoteca, como será explicado a seguir.

II – QUANDO O IMÓVEL ESTÁ GRAVADO DE HIPOTECA

Nos casos de imóveis de construtoras, muitas vezes pode ocorrer de o imóvel estar gravado de hipoteca. Isto porque muitas vezes as construtoras se utilizam desta forma de garantia para financiar a obra.

Nestes casos, muito embora exista sobre o imóvel a hipoteca, o comprador deste imóvel não pode ser prejudicado.

Neste sentido, inclusive, a justiça entende que a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro não pode prejudicar o adquirente do imóvel, nos termos da Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça:

a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel.

Na verdade, a hipoteca tem de ser baixada na matrícula do imóvel para que haja o efetivo registro da escritura pública em nome do adquirente do imóvel.

III – A OMISSÃO DO VENDEDOR EM PASSAR A ESCRITURA GERA DANOS MORAIS AO COMPRADOR?

A questão referente aos danos morais deve se analisada caso a caso. No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais tem o entendimento de que a demora injustificada da construtora em baixar a hipoteca sobre imóvel vendido, como de outorgar escritura da venda, ultrapassa os limites do mero aborrecimento, e caracteriza dano moral.

Neste sentido, vide jurisprudência sobre o tema:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – DEFERIMENTO DA TUTELA PROVISÓRIA NA SENTENÇA – CUMPRIMENTO DA DECISÃO DE CARÁTER PROVISÓRIO – PERDA DO OBJETO DO RECURSO – INOCORRÊNCIA – MÉRITO – CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – QUITAÇÃO DO PREÇO DO IMÓVEL PELO ADQUIRENTE – DEMORA NA BAIXA DE HIPOTECA E DE OUTORGA DA ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA – DANO MORAL CONFIGURADO – FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO.

– A demora injustificada da construtora em baixar a hipoteca sobre imóvel vendido, como de outorgar escritura da venda, ultrapassa os limites do mero aborrecimento, e caracteriza dano moral. 

– Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando o seu patrimônio. A indenização pelo dano moral possui caráter punitivo, para que o causador do dano, diante de sua condenação, se sinta castigado pela ofensa que praticou; possui também caráter compensatório, para que a vítima receba valor que lhe proporcione satisfação como contrapartida do mal sofrido.

– A quantificação da indenização pelo dano moral requer: (1) capacidade/possibilidade do que indeniza, pois este não pode ser levado à ruína, e (2) suficiência ao que é indenizado, pela satisfação diante da compensação obtida, sem que ocorra enriquecimento ilícito ou exploração do Poder Judiciário como nascedouro de proventos. (TJMG – Apelação Cível 1.0000.17.032258-0/001, Relator(a): Des.(a) Ramom Tácio , 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 07/12/2017, publicação da súmula em 11/12/2017)

No entanto, recomenda-se que a análise de cada caso seja feita com cautela e antes de o interessado pleitear os devidos danos morais na justiça, notifique o vendedor com a intenção da outorga da escritura pública definitiva, conforme mencionado no início deste artigo.

Caso o comprador do imóvel esteja passando por situação semelhante, é importante que ele procure o advogado especialista em direito imobiliário de sua confiança.

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